No Metal, nada é sagrado. Ou será que é? Entre riffs pesados, capas perturbadoras e letras que desafiam tudo aquilo que a sociedade considera intocável, sempre surge a pergunta: existe um ponto em que a blasfêmia deixa de ser arte e passa a ser apenas ofensa?
A blasfêmia, segundo o dicionário, é ofender aquilo que é considerado sagrado. Dentro do Metal, isso pode significar zombar de crenças, inverter símbolos, escrever letras a partir do ponto de vista do diabo ou simplesmente colocar um crucifixo de cabeça para baixo. Para alguns, isso é arte. Para outros, é intolerável. Mas afinal: existe limite entre a arte e a intolerância?
O Metal nasceu para questionar regras, provocar e brincar com dogmas. Bandas brasileiras como Mystifier, Impurity e a consagrada Sarcófago sempre abordaram a religião e o cristianismo de forma crítica. Muitas vezes, suas letras têm o claro intuito de chocar, de “blasfemar”, mas também de fazer pensar sobre os limites impostos pela sociedade. Mesmo para fãs apaixonados, como eu, há letras que provocam desconforto — o caso da polêmica “Little Julie” do Sarcófago é um exemplo.

É mais complexo quando o tema deixa o campo musical e vai para nas páginas policiais
Fora do Brasil, a Noruega certamente se tornou símbolo do Black Metal blasfemo nos anos 90. Bandas como Mayhem, Burzum e Gorgoroth ultrapassaram a música e levaram para a vida real atitudes criminosas: assassinatos, perseguições, bem como queima de igrejas. Nesse ponto, a reflexão é inevitável: até onde vai a liberdade artística? Quando a arte deixa de ser arte e passa a se misturar com a realidade de forma perigosa?
Outras bandas também ficaram marcadas pelo uso da blasfêmia como espetáculo. Glen Benton, do Deicide, queimou uma cruz invertida na própria testa como símbolo de rebeldia eterna contra a religião. Já o Gorgoroth ficou famoso por shows com cabeças de animais empaladas, crucificações encenadas e litros de sangue no palco, o que resultou em processos criminais e censura.
Mas, olhando para os dias de hoje, será que ainda faz sentido levar a blasfêmia tão a sério? Em muitos casos, o que antes parecia rebeldia agora soa apenas como marketing. Para muitas bandas, chocar virou um meio de vender uma imagem e alcançar um público. O polêmico Ghost, por exemplo, divide opiniões: não é uma banda de Metal extremo, mas usa a estética e a simbologia religiosa para criar uma atmosfera de provocação. Para uns, isso é genial; para outros, não passa de teatro.

Liberdade artística ou ofensa?
No fim, talvez o limite da blasfêmia não esteja nem na lei nem na moral de cada pessoa, mas sim no momento em que a provocação deixa de gerar reflexão e vira apenas barulho vazio. A questão é simples: a blasfêmia no Metal é liberdade artística ou mera ofensa? O palco pertence ao artista como território onde tudo é permitido, ou deveria existir um código de ética dentro do gênero?
O Metal sempre foi — e sempre será — um espaço para questionar tabus. A verdadeira provocação talvez não esteja em destruir símbolos, mas em fazer o público pensar.
No vídeo abaixo, tratei exatamente deste assunto. Se não conhece meu canal Além do Metal Clássico, convido a se inscrever e participar dos diversos temas trazidos à luz.