Gravadora: Cogumelo Records
Belo Horizonte, metade da década de 80, espaço e tempo importantíssimos e extremamente produtivos para o Metal Sul Americano e o Underground mundial. Nos primórdios do desenvolvimento do Metal extremo do Triangulo Mineiro, tínhamos o Mutilator, Holocausto, Sarcófago, Chakal, e o todo poderoso Sepultura. Assim como maior parte da cena Heavy Metal Tupiniquim, os registros de Thrash vieram muito tarde, se comparados a outros países proeminentes, entretanto, o verdadeiro arsenal de destruição, que foi lançado entre 1986 e 1990, compensou o atraso com maestria, se tornando peça fundamental pro surgimento dos subgêneros que ainda caminhavam. E nesse contexto entra o podre e sujo Chakal, ainda em 1986, com a demo “Children Sacrifice”, produzida pela própria banda. No mesmo ano, surge das entranhas da Cogumelo Records, o lendário Split “Warfare Noise I”, que contava com Holocausto, Mutilator, Sarcófago e o próprio Chakal, nos presenteando com “Cursed Cross” e “Mr.Jesus Christ”. Em 1987, nasceu o debut “Abominable Anno Domini”, considerado um dos registros de Thrash/Black Metal mais devastadores e extremos lançados naquele ano. Impossível falar do Chakal sem citar as contínuas mudanças de formação ao longo dos anos, um dos fatores que impediu a banda de capitalizar o sucesso e notoriedade que vinha angariando.

Até o lançamento do debut, a formação era composta por Vladimir Korg (Vocal), Mark (Guitarra) Destroyer (Baixo) e a única constante da banda, William Wiz na bateria. Em 1989, o Sr.Vladimir sai da banda, para cantar no “The Mist”, e entra o saudoso Marcelo Laranja assumindo vocal e baixo, Marcelo Simões na guitarra, permanecendo Mark e William Wiz. Essa formação gravou um dos álbuns mais matadores do Thrash Metal Brasileiro, talvez até mundial.

“The Man is his Own Jackal” é uma verdadeira pérola, por vezes esquecida no nosso Metal, esse registro mostra a evolução e amadurecimento musical da banda, num curtíssimo período de tempo, aquele Thrash podre e desenfreado dava espaço para um Thrash um tanto rebuscado, composições inteligentes e cômicas, e riffs extremamente criativos. O disco abre com 10 segundos de suspense, até tudo vir a baixo, sem aviso prévio, “Feel no Pain” da inicio a destruição sonora. “Silence n´Peace” une os elementos Crossover do Nuclear Assault e a aquela velocidade insana do Exodus, é puro Thrash, cheio de variações rítmicas destruidoras.
“Acme Dead End Road” é sem duvida, a faixa mais criativa deste clássico, é divertida e agressiva no ponto, além de momentos melódicos na interseção entre o solo e metade da faixa, é uma experiência catártica única, as influencias do Iron Maiden, Motörhead, e diria até Anthrax, é sentida aqui. “Holobyte” é a famosa “trava cervical”, só o nome da faixa faz o meu pescoço doer intensamente, é agressiva, rápida e muito bem construída, são duas tarefas aqui, ou bater cabeça ou escutar a criatividade instrumental dos caras, reza a lenda que dá pra fazer os dois. A Cesar o que é de Cesar, a produção não é das melhores, estamos falando dos primórdios de produções de Metal feitas no Brasil, nem todo mundo tinha o privilégio de requisitar presença de um Scott Burns em terras brasilis, mas os caras simplesmente passaram por cima desse fator, e conceberam um registro icônico e importantíssimo, eu apontaria, facilmente, como principal fator responsável por isso, o desempenho fantástico de Mark e Eduardo Simões nas guitarras, porém é um trabalho tão bem construído e executado, que o mérito vai para todos os membros desta formação.
De volta à glorificação da violência musical, temos “Hangover”, uma amalgama sinistra entre Slayer, Angel Witch e Death Angel, o resultado é uma frenesi escabrosa. “Santa Claus Has Got Skin Cancer”, a faixa que chamou a minha atenção instantemente antes mesmo de escutar o registro, justamente por conta do titulo, acabou sendo realmente a faixa mais cativante, desde a composição lírica que critica feroz e comicamente o lado podre do feriado natalino…”A igreja te criou / o capitalismo te engordou / você não esta enganando mais ninguém, Filho da P#@a!”. Em “In Vain” podemos ouvir melhor o prazeroso timbre das guitarras, desde os devastadores riffs até os arrebatadores solos, é um deleite esquisito. “S.S.C 333” é uma faixa instrumental ao estilo Marcyful Fate, verdadeira obra de arte, lembra a sonoridade das banda da NWOBHM (New Wave of British Heavy Metal).

“Syntech Tears”, faixa que encerra o disco com maestria, abre com uma das mais icônicas frases do cinema mundial, no clássico Blade Runner (1982)…”Todos esses momentos serão perdidos no tempo, como lagrimas na chuva…Hora de Morrer!” Frase dita com uma voz robotizada e sinistra, antes da pancadaria comer solta, apesar dessa ser uma das faixas mais “controladas”, ela é igualmente insana à suas antecessoras, devo destacar os vocais alucinantes durante toda a faixa, criando uma atmosfera única de manicômio, do tipo Asilo Arkham mesmo. Bom, depois de chegar a conclusão que o “homem é o chacal do homem”, não estamos falando aqui do melhor e mais conceituado registro do Chakal, porém é aquele tipo de álbum que possui uma importância histórica tremenda, ainda mais pelo fato de ter sido lançado no inicio da década de 90, onde toda e qualquer banda realmente precisava ter sangue nos olhos e dois pares de “huevos” bem resistentes, para que pudesse fazer algo que causasse impacto na cena, e os caras realmente conseguiram, “The Man is His Own Jackal” alcançou os ouvidos ouriçados dos europeus, alcançando um modesto sucesso em sua época de lançamento, e está marcado na história do Metal para sempre. Há alguns atrás, mais precisamente entre os anos de 2006 e 2008, a Cogumelo Records deu inicio a “Cogumelo Remasters”, que trazia, além de outros clássicos, os primeiros registros do Chakal, totalmente, remasterizados e, caprichosamente, lançados em digipak e slipcase, “The Man is His Own Jackal foi lançado em versão dupla, junto com o também destruidor “Death is A Lonely Business” de 1993, no qual os caras incorporaram elementos do Groove Metal no meio daquele Thrash insano e ficou uma maravilha…Mas isso é outro papo.
O Chakal só voltaria a gravar outro registro de estúdio em 2002, após um hiato de quase 10 anos. A questão aqui é, você caro leitor curioso e batutinha, recomendo imensamente este clássico escondido no baú, que tive a honra de ir buscar para sua apreciação, é um registro pra ser consumido sem moderação e sem escrúpulos, não tenho adjetivos o suficiente para destrinchar esse álbum absurdo, apenas na prática temos a melhor noção dos fatos,
Nota: 8,9
Integrantes:
- Marcelo Laranja (baixo e vocal)
- William Wiz (bateria)
- Mark (guitarra)
- Eduardo Simões (guitarra)
Faixas:
- 1. Fell No Pain
- 2. Silence n´Peace
- 3. Acme Dead End Road
- 4. Holobyte
- 5. Hangover
- 6. Santa Claus Has Got Skin Cancer
- 7. In Vain
- 8. S.S.C 333
- 9. Synthetic Tears
Redigido por Giovanni Vaz