Se existem as já consolidadas novas safras do Thrash e do Heavy Metal, por exemplo, o Frozen Dawn se adequa ao novo sopro congelante do Black Metal, tendo o seu surgimento datado em 2006. Com o momento bastante propício para o Metal Extremo, os representantes de Madrid, capital da Espanha, resolveram expandir a sua discografia para além da trinca inicial, apresentando, dessa forma, o seu quarto full length. “The Decline Of The Enlightened Gods” foi lançado dia 10 de fevereiro via Transcending Obscurity Records e possui dez faixas com um cover do Necrophobic para a canção “Blinded By Light, Enlightened”.
Detalhes sobre a produção do álbum
A masterização ficou por conta de Dan Swanö, enquanto a arte de capa é assinada por Mariusz Lewandowski (R.I.P 2022).Atualmente, Dani Grinder (vocal, guitarra, ex-Haemorrhage), Antonio Mansilla (baixo, guitarra e violão, ex-Hordak) e Arjan van der Wijst (bateria, ex-Avulsed) formam o power trio hispânico. Nota-se, portanto, que a banda possui currículo no circuito underground e isso acaba trazendo um pouco mais de interesse, caso quem esteja conferindo informações sobre o Frozen Dawn, também goste de alguma das ex-bandas dos integrantes. “The Decline Of The Enlightened Gods” foi masterizado no Unisound Studios.
Dito isso, vamos ao palácio central do Metal Negro para conferir o disco do Frozen Dawn, a fim de entender detalhadamente sobre essa nova e profana obra.
O início
A mística da magia arbitrária que corrompe a alma do ser que se diz protegido de todo o mal é iniciada sob o comando de “Mystic Fires Of Dark Allegiance”. As labaredas místicas sombriamente leais inserem ao mundo auditivo mais um capítulo do submundo arcano e profano com uma pequena simulação do que condiz a capa do disco. A cadeia de quedas das águas fazem com que as sonoridades entrem em cena e se ajeitem para iniciar uma receita estrondosa de Black Metal ao melhor estilo Varathron e Dark Funeral atual. Bateria com variações e decolando para que os outros instrumentos apareçam e com poder de ataque fulminante. A pausa coloca o lado melancólico, sombrio e sufocante quanto à sonoridade inserida nesse trecho. Além disso, a guitarra melódica complementa as bases pesadas e velozes, servindo para elevar a sensação de grandeza que a canção por si só traz.
“Em direção à ruína profana de Marath / Rostos deformados transformados em pedra / Eu fui enviado para um sono eterno / Entre o fedor de chamas fosfóricas” –
O rito inicial coloca à tona acontecimentos de um passado distante e lamuriante, contendo facas envenenadas, cânticos proibidos, feitiços profanos, sepulturas e santuários profanados, tumbas destruídas, dentre muitas outras coisas como fogos místicos, a chama negra que queima, embora não haja fogo. Ao mesmo tempo, temos as abóbadas de Isth, os reinos congelados de fragmentos de Aetherium. “Spellbound” dá a segunda cartada à mesa da nova trama (não é cover do Tygers Of Pan Tang) para que o massacre sonoro ganhe ainda mais corpo.
O trabalho do line-up
Os primeiros repiques na caixa do kit de Arjan van der Wijst servem como vários tapas para acordar do torpor a qualquer custo e ouvir o que a execução aurora sonora tem a oferecer. Tremolos junto aos riffs, dedilhados insanos e lúgubres, remetendo ao Mystic Circle, colocam a faixa em evidência, somada aos solos enriquecidos com urânio musical. As linhas de baixo respeitam os sinais de trânsito local, possuindo nuances de Vreid e a canção fica bem posicionada ao lado direito do capitão-mor do mundo inferior.
“Eu vejo os feixes de auroras negras / Como uma serpente devorando sua própria semente / Onde um vasto mundo escuro está repleto de ira hostil” –
Tornando o mundo ainda mais sombrio
Enquanto o mundo ganha um tom sombrio e completamente macabro, respira-se apenas o gelo que representa o nascer da lua negra às margens do desespero. Assim sendo, resta suplicar aos éons por proteção diante de tal calamidade e início do fim dos tempos. O éon é referido como a maior subdivisão de tempo na escala de tempo geológico, sendo menor que um superéon e maior que a era.
Logo depois, “Black Reign Awaits” trata da recuperação e restauração de um reino repleto de figuras aterrorizantes e medonhas onde todos estão mal e são proclamadas para a segurança retome seu percurso e não nos deixe perdidos sem um reinado para chamar de nosso. Dentre as figuras temos Iaoth, Asheal e Niemeth.
“Rise Iaoth!
In a voluptuous deadly dance
Rise Asheal!
Into the starless sky
Rise Niemeth!
In the majesty of the night”
Tal hino das trevas apresenta em sua estrutura sonora aquele eco característico de quando uma banda resolve tocar seu som sem a parte de introdução. Ou seja, o lance é direto, sem passagens melódicas, com as linhas mais cavernosas se sobrepondo como um todo, lembrando o Besatt em seus momentos mais insanos e desafiadores.
Metal Negro e sua desgraceira sonora
Os diferenciais enriquecem e enobrecem a trama, ao mesmo tempo em que ditam um ritmo de contágio supremo quando ao ato de prender o ouvinte e alimentá-lo com o puro suco do Metal Negro é bem executado. Quando a pausa antecede o solo, é como se abrisse uma fenda no céu noturno e uma chama negra cortasse o horizonte ao meio, rasgando o tecido multiversal e abrindo espaço para que as mais variadas e poderosas criaturas invadam e festejem diante do plano terreno. Em suma, os solos são encaixados e tocados com maestria, além das dissonantes certeiras dessa que é uma curta canção para os padrões da receita sonora do disco.
“Frozen Kings” inicia sua gélida jornada com dedilhados no prelúdio até que estes se apresentem com os principais acordes da música. Tudo isso se completa assim que as linhas de bateria ganham contornos em pedais duplos. Tudo fica bem montado ao observar as linhas pantanosas do contrabaixo de Antonio Mansilla. Viradas de bateria emendam a corrida incessante em busca de um final marcante para os reis da sonoridade extrema.
A dupla de guitarristas
Como Mansilla e o vocalista Dani Grinder são creditados também como guitarristas, fica inacessível a exaltação de seus nomes perante aos seis poderosos e flamejantes encordoamentos. Pois, é fato que as guitarras realmente trabalham assimetricamente e evidenciam um conjunto de arranjos ótimos para se ouvir.
“A grande batalha está chegando / Um apelo aos nossos irmãos do passado / Nosso exército da desgraça chegará / Carregando tempestades durante a noite” –
A tempestade gelada está furiosa e os patronos do inverno iniciam uma importante jornada junto ao exército das almas frias. Estes são os reis congelados, observadores do gelo e da noite, senhores de Winterland. Pilotos na tempestade e guardiões do norte. Eis os portadores do frio, além de serem os protetores do tecido de inverno. Os primogênitos de todos os tempos e a ira nos ventos do norte.
O multiverso da boa música e das grandes composições
É chegada a hora de enfrentar o multiverso da boa música e das grandes composições. Sendo assim, companhamos o valente e perseverante caminhante em “Wanderer Of Times”. Canção que revela aos quatro cantos do que uma banda espanhola de Metal Extremo pode ser capaz. Melhor faixa do álbum? Tire suas próprias conclusões!
Paralisantes de tão congelantes são as primeiras notas estendidas. O apocalipse sonoro acontece logo em seguida sob comando da cavalaria de Arjan. As guitarras funcionam como tempestade de lava, enquanto o contrabaixo causa todo o terremoto, fazendo desmoronar todas as rochas possíveis em suas sofríveis vítimas, contrastando com os ares de zero grau absoluto do tema e da sonoridade em si. Melodias rápidas complementam as investidas de guitarra nos arredores de uma cadeia montanhosa de ar rarefeito a quem não está habituado a caminhar nesse terreno quase branco em sua totalidade e de céu cinza chumbo. Dissection, Varathron, Necrophobic e Dimmu Borgir entram em cena quanto às nuances sonoras e até mesmo o Marduk nos trechos extremamente insanos. Os solos são devastadores e condizem demais com a “múzga”, além das partes menos velozes da trama. Tiraria minha cartola se não tivesse dado ela de presente para uma amiga.
“Assistindo os céus derramarem suas lágrimas congeladas / Eu ouço suas palavras desencadeadas de tempos amaldiçoados / E dos picos da montanha mais alta / Eu a ouço falando das velhas runas”
O lirismo negro do Metal extremo direto da Espanha
A arte lírica coloca em primeiro plano aquele que percorre um pesadelo sem fim através de todas as dimensões da matéria primordial, que levanta e segue para as paredes de pedra após despertar de sono eterno, cercado por incêndios florestais ancestrais, sendo este o andarilho dos tempos. “Oath Of Forgotten Past” chega para impor revelações de acontecimentos que foram jogados para trás. A poeira cósmica é tirada de baixo do tapete universal. Ao propósito da revelação acontecer em escalas milenares diante de um som que perturbará por eras a alma pecadora de um santo moribundo. Santo esse que permanece escondido atrás do púlpito e de sua maldita e amarrotada batina.
“Mestre da laceração / Dissecando com lâminas frias / Derramando o sangue negro da virgem / Nos salões de luto da desgraça” –
Considerado um Beholder de uma sabedoria antiga com poderes ímpios. Sendo também embaixador grotesco, o ódio entre os ódios, empalador dos nove deuses! Pois representa o poder de um rebanho de mil pragas! O início é recheado de blast beats e sequências altamente velozes de bateria. Já as guitarras, uma ultra pesada e cortante, ao passo que a outra é melódica e veloz, acompanhadas por um baixo que se mantém amplamente presente.
As notáveis influências do Frozen Dawn
Marduk, 1349, Lord Belial e até mesmo o Behemoth dos tempos de Pandemonic Incantations até Demigod. Todos eles podem ser notados por aqui em meio a ótimas camadas sombrias de som. A interpretação de Dani Grinder é emocionante de tão visceral que se apresenta durante o decorrer da faixa. Em outra parte antecedente ao solo, temos um duelo entre uma bateria massacrante e guitarras agudas e muito vivas, funcionando muito bem para o solo entrar e devastar toda a região esquecida por eras.
Black Metal cadenciado, mas não menos macabro
“Cosmic Black Chaos” possui um início enigmático nos moldes do Black Metal cadenciado, distorcido e contido em seus primeiros segundos de aparição. Logo após essa parte muito bem constituída, esse amálgama se concentra em expor toda sua fúria diante dos vários olhos do Beholder. A canção alterna seu compasso, incluindo mais partes distintas em busca de um glorioso propósito, como diria o Loki clássico na série Loki, da Marvel. Os solos se apresentam como o encaixe principal para a virada de jogo, contando com notas harmônicas, agudas e dissonantes. Os riffs principais retomam a dianteira e você encontra semelhanças com diversas bandas, incluindo uma em específico, o Karcinoma, banda de terras eslavas e dialeto cirílico.
Mudanças de andamento e dinâmica, inegavelmente, dão mais prazer ao ouvinte
As mudanças de andamento são um deleite à parte para qualquer entidade que posicione a ouvir essa mensagem agressiva sonora. O caos negro cósmico ocasiona o nascimento de uma estrela negra, Senhora dos deuses antigos e causadora de efeitos devastadores ao cosmos, buracos negros implodem diante das chamas do firmamento e em planos interdimensionais morte e vida não diferem. O caos está instaurado. Continuando o pandemônio musical, chegou a hora da faixa-título e os primeiros dedilhados servem para mostrar ao honorável público versos mergulhados em terrenos mais calmos, sem perder o peso notório em todas as outras composições.
“The Decline Of The Enlightened Gods” com uma musicalidade ainda mais agressiva
“The Decline Of The Enlightened Gods” acaba ganhando um revezamento de camadas, sendo mais agressiva e efusiva em determinados momentos, em outros mais ríspida, retomando a ótima cadência já citada. Uma clara alusão à brilhante faixa de “Virtus Asinaria – Prayer”, esplêndido álbum do Belphegor, lançado ano passado. Em meio às partes cadenciadas e cantadas/faladas em tom baixo, acobertado pelos pedais da bateria de Arjan, que simulam os motores da nave com a tripulação que observa a destruição atentamente, acompanhados por guitarras lamuriantes e um baixo que aponta para o abismo.
O abismo responde de volta e a batalha recomeça cheia de ímpeto e energia de volta. O declínio das almas dos deuses iluminados acontece de forma alucinante e prazerosa.
“Os deuses caídos sofrem infinitamente / Enquanto eles choram em gritos desesperados / Nas montanhas em ruínas”
Os deuses derrotados sofrem por conta da imortalidade, tornando o sofrimento e o vazio eternos. Cercado por horrores de dor infinita nos reinos proibidos de Niemeth, vivem sua eternidade divididos em pedaços infinitos na guerra ancestral por Winterland. São enjaulados entre pesadelos sem fim muito além dos caminhos de Isth, condenado ao exílio eterno.
Passagens calmas e angustiantes revelam as habilidades de Antonio Mansilla com as melodias acústicas em “The Fall Of Aeons”, servindo de abertura para um grandíssimo cover…
“Blinded By Light, Enlightened By Darkness” é o nome da canção escolhida para encerrar de forma esplendorosamente destruidora. O detentor original da obra é o magnífico Necrophobic (canção pertencente ao álbum “Hrimthursum”, de 2006), o que casa muito bem com a proposta sonora do álbum e da horda espanhola. Cover de respeito feito por uma banda que respeita seus ídolos, seus ouvintes e a si mesma ao tratar com ampla dedicação a elaboração dessa grata surpresa. Após a audição concentrada, você se sentirá “cego pela luz, iluminado pela escuridão”.
Informações profanas adicionais:
Assim como em outros subgêneros, o Black Metal vive um grande momento, tanto com relação aos medalhões do passado, quanto aos novos exércitos do submundo. O Frozen Dawn pode se considerar participante responsável por esse crescimento e ao lançar seu mais novo full length, mostrando que realmente pode e deve fazer parte como banda importante e influenciadora para o mequetrefe entender um pouco mais sobre o Metal sem luz.
Sobre os músicos temos Arjan com vontade de tocar seu kit, bem produzido e elaborado, sendo uma grata jóia lapidada e lançada em 2023. As linhas de bateria contribuíram e muito para a qualidade do alicerce da banda. Antonio Mansilla também não faz por menos e, formando dupla com Dani Grinder na concepção das seis cordas, mostra do que é capaz no baixo, embora o tipo de som não exija tanto do instrumento. Mansilla também mostra eficiência nas guitarras solo e base, assim como o próprio Grinder faz. Por sua vez, Dani Grinder cuida de suas linhas sonoras de guitarra como ninguém. E sobre o Antonio, as partes de violão inseridas no trabalho dão um charme especial a um trabalho obscuro e sombrio, sem que soe chato ou deselegante. O power trio conseguiu lançar mais um grande disco, ultrapassando a barreira dos três álbuns, ampliando sua pequena e rica discografia.
Curiosidades hipotérmicas:
Sobre Naya’il, esse termo vem a ser um outro nome para o anjo também chamado Lawidh. Ele é um dos anjos que residem no Quarto Céu, que serviu como guia para o santo sufi – do sufismo, a qual é conhecido como a corrente mística e contemplativa do Islã – Abu Yazid durante seu mir’aj (junção de duas palavras que representam as duas partes de uma Jornada Noturna, chamadas Miraj e Isra), ascendendo aos Sete Céus. Segundo a lenda, o anjo ofereceu a Abu um reino incrível para ele governar sozinho. Essa oferta foi rejeitada pelo líder sufi porque ele percebeu que era um teste de sua devoção ao Senhor.
A Jornada Noturna, segundo a tradição islâmica, o profeta do islã, Maomé, fez durante uma única noite por volta do ano 621. Ela foi descrita como uma viagem física e espiritual.
O Beholder é uma criatura conhecida no mundo dos games e do RPG, mais precisamente no universo de Dungeons and Dragons. Trata-se de uma criatura, conhecida também como Observador ou Olho-Flutuante, e possui características bastante específicas. O ser possui um olho central e dez olhos adjacentes, cada um com um poder específico. O olho central dispara um raio de anti-magia, podendo controlar a abrangência desse raio com o abrir ou o fechar da sua pálpebra central. Além da criação para os jogos on line e presencial, o termo é extremamente antigo e está presente em Gênesis, no Velho Testamento da Bíblia Sagrada, indicando a onipotência e onipresença daquele ser malevolente e implacável, que se dizia ser o comandante dos céus.
“Initiator of the ionic vortex
Archetype that spawns new nights
Tied to the eternal cycle
Twisting the nature of light
Into timeless places among universes
The black goddess rides”
Nota: 9,3
Integrantes:
- Dani Grinder (vocal, guitarra rítmica e solo)
- Antonio Mansilla (baixo, guitarra solo e violão)
- Arjan van der Wijst (bateria)
Faixas:
1. Mystic Fires Of Dark Allegiance
2. Spellbound
3. Black Reign Awaits
4. Frozen Kings
5. Wanderer Of Times
6. Oath Of Forgotten Past
7. Cosmic Black Chaos
8. The Decline Of The Enlightened Gods
9. The Fall Of Aeons
10. Blinded By Light, Enlightened By Darkness (Necrophobic cover)
Redigido por Stephan Giuliano
Bela resenha. Parabéns.