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O tribunal inquisitor da internet x Pablo Vergara

Assim como muitos de vocês, além de ouvir muito Heavy Metal, também gosto bastante de filmes. Especialmente, aqueles ligados ao terror, ao suspense, a ficção e, logicamente, ao sobrenatural. Há tempos atrás, me deparei com as histórias bizarras à respeito do Hotel Cecil, localizado no centro de Los Angeles (Califórnia), na região conhecida como Skid Row (uma espécie de cracolândia estadunidense). O Hotel possui um histórico de crimes grotescos, inquilinos problemáticos e casos não solucionados, quem gosta de ler e se informar sobre estes assuntos, certamente, deve ter visto algo sobre este lugar e, claro, sobre a morte macabra da jovem turista Elisa Lam.

   

Para não nos estendermos muito no tema menos importante deste artigo, vou contar por cima o caso. Elisa era uma jovem estudante canadense que resolveu viajar sozinha pela costa oeste dos Estados Unidos. Ao chegar em Los Angeles, se hospedou no Cecil e, após alguns dias, desapareceu misteriosamente. O caso aconteceu em 2013 e ganhou muita notoriedade na mídia pois a polícia local, sem pistas de seu paradeiro, divulgou um vídeo registrado pelas câmeras internas do hotel que mostrava a última aparição da moça. com vida. A intenção era de que alguém poderia ajudar nas investigações fornecendo alguma informação que pudesse solucionar o caso de uma vez por todas, mas ao invés disso, o conteúdo das imagens gerou uma comoção sem precedente na internet e mais atrapalhou do que ajudou.

Como vocês podem ver, o vídeo é um tanto bizarro e deu asas a imaginação de muita gente. Nele, vemos Elisa agindo de uma maneira estranha, entrando no elevador e apertando diversos botões, a moça ainda olha para fora como se estivesse fugindo, depois faz gestos com as mãos como se estivesse interagindo com alguém, sai do elevador em direção a algum lugar desconhecido e desaparece misteriosamente. Teorias sobre possessões, assombrações, assassinos em série, perseguidores e outras mais, ganharam força, mas nenhuma evidência foi encontrada. Dias depois seu corpo nu foi encontrado sem vida em uma das caixas d’água no terraço do hotel e a polícia simplesmente não sabia o que tinha acontecido.

Devido a visibilidade e ao interesse sobre o caso, um grupo de internautas, que se autodenominou “os detetives da web”, tentou investigar por conta própria e encontrar algo que a polícia não havia encontrado. Diversos youtubers e influenciadores digitais foram ao Cecil, refizeram os passos de Elisa, gravaram vídeos mostrando detalhes do ambiente e, além disso, reviraram as redes sociais da moça procurando qualquer indício que poderia ser uma nova prova. E foi aí que chegaram ao músico Pablo Vergara, na época, conhecido pelo pseudônimo Morbid…

Pablo era um músico ligado ao Metal extremo e fez parte das bandas Dynasty Of Darkness (Symphonic Black Metal), Synergy Of Souls (Brutal Death Metal) e Slitwrist (Gothic Metal). Ele havia se hospedado no hotel Cecil na mesma época em que Elisa Lam, só que um ano antes. Vergara postou um vídeo ao qual estava dentro do hotel e este vídeo foi encontrado pelos tais “detetives da Web”, que não verificaram a data marcando um ano antes e começaram a associar o músico como sendo um suposto assassino da jovem. Pablo estava no México gravando um álbum na data em que Elisa desapareceu, ele tinha documentos que comprovavam isto, mas o tribunal de justiceiros da internet não se importou em averiguar nada disso e se deixou levar pelo visual macabro e pelos vídeos perturbadores que o jovem publicava. Sem pesquisar a fundo ou se aprofundar no que consiste o Metal extremo, se horrorizaram com o conteúdo lírico de suas músicas e, logo, tinham todos os elementos que precisavam para que a sua teoria fosse “embasada”.

Abaixo, um trecho da série “Cena do Crime: Mistério e Morte no Hotel Cecil”, da Netflix, que finalmente faz justiça a Pablo mostrando como uma história fictícia pode viralizar e causar sérios danos a uma pessoa.

Vergara começou a receber centenas de mensagens em suas redes o chamando de assassino e ameaçando a sua integridade física. Ele gravou um vídeo se dizendo inocente, mas foram tantas as denúncias em seus perfis, que ele perdeu todas as suas redes. Foi banido de Facebook, Twitter, Youtube e etc. O músico teve sua vida e trabalho destruídos, perdeu o foco e entrou em uma espiral de paranoia e medo. Pouco tempo depois, tentou cometer suicídio e jamais conseguiu voltar a compor para suas bandas.

Obviamente, os “detetives da web” perceberam pouco tempo depois que o músico era inocente, afinal, o caso foi solucionado e ficou comprovado que Elisa teve uma morte acidental devido a problemas mentais. Mas jamais houve um pedido de desculpas a Pablo Vergara. O dano estava causado e tudo por que pessoas comuns resolveram bancar os investigadores criminais e, mais do que isso, resolveram escolher um vilão que simplesmente não existia. A inquisição online foi avassaladora na vida deste jovem músico e as pessoas seguem fazendo coisas parecidas até os dias de hoje. Ninguém se importa com a verdade, teorias conspiratórias sempre são mais atraentes aos olhos de quem quer acreditar nelas. As pessoas nutrem uma necessidade quase incontrolável de opinar, julgar, sentenciar e punir. Tudo o que utilizam para fazer isso são meras opiniões porcamente combinadas a dados distorcidos ou manipulados. Os cancelamentos fazem isso e os patrulheiros da internet trabalham dia e noite para assassinar reputações. Mesmo que se prove o contrário, o estrago causado nunca é revertido, o pedido de desculpas quase sempre é esquecido e, quando feito, nunca tem a mesma proporção das acusações.

Pablo Vergara após a tentativa de suicídio, acordou em um hospital psiquiátrico e teve sua vida mudada para sempre. Felizmente, ele conseguiu dar a volta por cima, estudou cinema e em 2019, recebeu o prêmio de Melhor Filme Internacional de Ficção no Festival Internacional de Cinema e Metal com seu curta “Necromurder”. Apesar disso, a sua história como músico foi interrompida e Pablo poderia não ter sobrevivido.

Eu sei que vivemos em uma época onde todos opinam sobre tudo, mas precisamos pensar antes de sair por aí acusando alguém sem ter o mínimo de embasamento. Os tribunais inquisitivos da internet geralmente representam algum tipo de narrativa imposta por alguém que possui interesses em replicar determinado discurso e, mesmo que você pense estar apenas emitindo uma simples opinião, pode estar agindo precipitadamente contra um inocente. Lembre-se, hoje isso é feito com alguma pessoa aleatória, amanha pode ser você. Se não dermos um fim a esta cultura imbecil de cancelamentos, pessoas inocentes seguirão sendo vítimas da irresponsabilidade de outras. Nota do redator: para mais detalhes, assista a série “Cena do Crime: Mistério e Morte no Hotel Cecil”, da Netflix, são 4 episódios de aproximadamente uma hora de duração cada, onde tudo é contado com muita riqueza de detalhes.

Redigido por Fabio Reis

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