Enquanto muitos reclamaram da escolha dos headliners na primeira edição do festival Summer Breeze organizado no Brasil, argumentando que tais nomes não seriam capazes de “carregar o fest nas costas”, a produção nem ligou para as críticas prévias e após dois dias de evento nivelados por cima, o veredicto foi unânime: os organizadores estavam certos e a choradeira pré-evento não se refletiu de fato.
Com uma base sólida e fiel de fãs, os bardos alemães do Blind Guardiam foram os escolhidos para fechar a noite do primeiro dia do Summer Breeze. E eu preciso fazer um parêntese pessoal aqui, o Blind Guardian foi uma das bandas mais importantes em minha experiência com a música nos anos 90. Considero a discografia absolutamente perfeita até o quinto registro, “Imaginations From The Other Side”, de 1995, e gosto bastante do trabalho que o sucedeu, o aclamado “Nightfall In Middle Earth”, de 1998. Mas depois disso, confesso que a banda foi perdendo um pouco de seu brilho, ao menos na minha avaliação pessoal. Parei de me encantar com os discos subsequentes e com o lançamento de “Twilight Orchestra” realmente pensei que jamais iria reativar minha paixão pelo trabalho.
Felizmente eu estava errado e o último registro de estúdio, “The God Machine”, chegou para provar que a chama ainda estava acesa e os bardos poderiam soar ferozes como no início de carreira, mas sem perder todas as nuances melodiosas dos álbuns lançados nas últimas duas décadas. Enfim, meu interesse foi absolutamente renovado e fiquei na expectativa para assistir ao show do Blind Guardian e poder conferir todos os grandes clássicos do passado e também ver como as novas músicas soariam ao vivo.
Parêntese fechado, no dia 29 de abril, por volta das 20:00, horário local, o Memorial da América Latina recebeu de braços abertos o vocalista Hansi Kürsch, os guitarristas André Olbrich e Marcus Siepen e o baterista Frederik Ehmke. O Início não poderia ser melhor e “Imaginations From The Other Side” abriu o show de forma apoteótica, fazendo todos os presentes cantarem seu refrão poderoso. Sem descanso, “Welcome To Dying” massacrou sem piedade nossos ouvidos e, logo neste início, me surpreendi com a performance arrasadora de toda a banda. Completando o time, Michael “Mi” Schüren estava encarregado dos teclados e o baixista Johan van Stratum foi uma excelente surpresa. Talvez por conta do som estar muito ajustado e a platéia poder ouvir cada instrumento de forma perfeita, ficou ainda mais evidenciado o fato dos músicos serem todos realmente competentes.
A noite prometia e foi com esta sensação de que algo muito especial estava reservado para os presentes que ouvimos duas faixas do clássico “Nightfall In Middle Earth”, a power ballad “Nightfall” e a majestosa “Time Stands Still (At The Iron Hill)”. Início de show realmente eletrizante, mas nada se compararia ao que estava por vir. Ao final de “Time Stands Still (At The Iron Hill)”, o telão apresentou a capa do clássico “Somewhere Far Beyond” e a intro de “Time What Is Time” começou a ser tocada. Imediatamente me lembrei que o Blind Guardian andou tocando o disco na íntegra em 2022 por conta do seu aniversário de 30 anos e pensei, “será?”. A sequência com “Journey Through The Dark” demonstrou que sim, receberíamos este presente naquela noite. O público foi ao êxtase canção após canção. “Black Chamber”, “Theatre Of Pain”, “The Quest For Tanalorn” e “Ashes To Ahes” vieram à seguir e tudo simplesmente virou mágica. Hansi cantando como nunca e desfilando as notas mais altas com extrema precisão. Tudo nos tons originais e com uma qualidade sonora inacreditável.
Era chegada a hora de um dos momentos mais bonitos que já presenciei em um show de Heavy Metal e “The Bard’s Song – In the Forest” arrancou lágrimas da platéia. O refrão foi cantado em uníssono em uma total simbióse entre músicos e fãs. Em uma palavra: inesquecível! A co-irmã “The Bard’s Song – The Hobbit” veio logo depois e também foi muito bem recebida, mas eu já estava pensando na canção título, uma das minhas preferidas de toda a discografia. Quando a intro “The Piper’s Calling” começou a ser entoada, confesso que fiquei arrepiado. “Somewhere Far Beyond” (a música), é uma verdadeira bordoada e foi executada de forma sublime com todos entoando como um mantra os versos:
“Somewhere far beyond
The march of time it has begun
Somewhere far beyond your reality
And then the march of time begins”
O meu reservatório de energia já estava no final depois disso, mas minha mente pensava, “o que mais teremos esta noite?”. Se o show tivesse terminado neste momento, todos teríamos ido para casa com largos sorrisos estampados no rosto, mas ainda tinham mais algumas surpresas. “Lord Of The Rings” foi uma delas e mais uma vez cantamos todos os versos junto com Hansi. Apenas neste ponto do show, me lembrei que o Blind Guardian tinha um ótimo novo trabalho e isto veio à tona com a porrada “Violent Shadows”, que precisamos ser justos e dizer que soa ainda mais visceral ao vivo.
Hansi conversou com o público e era nítido que ele sabia o que estava nos proporcionando. Antes do apocalipse sonoro se instaurar mais uma vez no Memorial da América Latina, ele introduziu a próxima música de forma calma da seguinte maneira:
“The one and only Majesty!”
Foi inacreditável e se alguém me contasse eu acharia exagero, mas a garra que a banda demonstrou ao tocar estas canções mais antigas foi realmente marcante. Todos sabíamos que ainda havia tempo para mais e se não bastasse um tiro de misericórdia, recebemos dois, e eles atendem pelos nomes “Valhalla” e “Mirror Mirror”. Me senti absolutamente esgotado, mas ao mesmo tempo satisfeito e com a certeza de ter assistido a um dos melhores shows da minha vida. E posso afirmar sem falsa modéstia que foram muitos.
Indo embora, as imagens daqueles shows europeus onde a platéia canta os versos de “Valhalla” sem parar após o término da música foram substituídas totalmente pelas memórias do público brasileiro fazendo exatamente a mesma coisa. Este foi um show daqueles para lavar a alma, sem dúvida. Quem não era fã, certamente, passou a ser e com o anuncio feito por Hansi que a banda retornará ao Brasil ainda este ano, só posso concluir que estarei presente novamente, desta vez, para poder conferir o poderio de fogo das novas canções. A performance do Summer Breeze foi um presente a este que vos escreve e a todos que estiveram no Memorial da América Latina no dia 29 de abril.
Em minha humilde opinião, o melhor show de todo o evento. E com sobras…
“Valhalla – Deliverance
Why’ve you ever forgotten me
Valhalla – Deliverance
Why’ve you ever forgotten me”
Setlist:
- Imaginations From the Other Side
- Welcome to Dying
- Nightfall
- Time Stands Still (At the Iron Hill)
- Time What Is Time
- Journey Through the Dark
- Black Chamber
- Theatre of Pain
- The Quest for Tanelorn
- Ashes to Ashes
- The Bard’s Song – In the Forest
- The Bard’s Song – The Hobbit
- The Piper’s Calling
- Somewhere Far Beyond
- Lord of the Rings
- Violent Shadows
- Majesty
Encore:
- Valhalla
- Mirror Mirror
Redigido por Fabio Reis