Se hoje o Hypocrisy possui linhas mais trabalhadas com melodias que se comunicam com as camadas mais graves, no início a coisa era um tanto diferente por apresentar uma sonoridade mais cavernosa, rústica e ríspida. Padrão esse adquirido quando o Death Metal foi construído entre a segunda metade dos anos 80 e início dos anos 90 nos Estados Unidos, e pouco depois ao redor do mundo. Algumas bandas isoladas pelo globo iniciavam algo voltado para essa sonoridade mais assustadora, digamos assim, até por que não era muito comum uma banda executar um som tão sujo nessa época. Observando no planisfério a partir da magnífica Suécia, deixo Estocolmo um pouco de lado para seguir por Ludvika, Dalarna. Calma, ainda estamos em território escandinavo e no mesmo país. Só que a capital não é a bola da vez. Afinal, o Hypocrisy não é de lá. De acordo com informações, Ludvika é uma cidade situada no sul da província histórica da Dalecárlia, no atual condado de Dalarna. É uma cidade pequena com aproximadamente 14 mil habitantes, e é sede do município de Ludvika. Agora com o GPS configurado, vamos ao principal alvo da epístola.
Como um projeto solo, o jovem (à época) Peter Tägtgren montou o Seditious em meados de 1988. Somente em outubro de 1991 é que o nome mudou para Hypocrisy e oficialmente se tornou uma banda. Durante o final dos anos 80 e início dos anos 90, Peter morou nos Estados Unidos e foi fortemente influenciado pela cena Death Metal norte-americana. Voltando para sua terra natal, ele trouxe uma nova perspectiva sobre esta sangrenta e visceral vertente que tanto admiramos. O primeiro logotipo da banda foi idealizado por Masse Broberg (que viria a ser o vocalista) e foi feito por Peter Almlöf.
Em 5 de outubro de 1992 via Nuclear Blast, o Hypocrisy estreou no certame com o álbum “Penetralia”. Masse Broberg foi o vocal nas faixas de 1 a 9, enquanto Peter Tägtgren (guitarra) fez os vocais na faixa 10, além de tocar teclado na mesma. E também tocou bateria nas faixas de 1 a 3 e 5 a 8. Mikael Hedlund (baixo), Jonas Österberg (guitarra), e Lars Szöke (bateria nas faixas 4, 9 e 10) completam o clássico line up desse disco. O próprio Peter Tägtgren ficou a cargo da produção e mixagem, tendo como produtor executivo Markus Staiger. A capa tem a assinatura de Dan Seagrave. Dada a ficha técnica para muitos adeptos recordarem e pegarem seus exemplares em seus respectivos santuários da boa “múzga” para conferirem junto à leitura é hora de entender como esse álbum se tornou clássico do estilo e, consequentemente, uma das principais referências de todo o Metal.
O ano de 1992 foi bastante agitado para os suecos tendo lançado além do debut, o split “Promo EP I” com as bandas Afflicted – esta sim oriunda de Estocolmo que surgiu em 1988 com o nome “Afflicted Convulsion”, sendo que em 1990 reduziram para Afflicted e durou até meados de 1995; Sinister – aquela mesma clássica holandesa que segue firme e nos brindou com mais um álbum em 2020, o ótimo “Deformation Of The Holy Realm”; e Resurrection – banda dos Estados Unidos que surgiu em 1990 e durou até 1995, e retomando as atividades dez anos mais tarde. A faixa escolhida para aparecer nesse split foi “To Escape Is To Die”. Faixa esta que consta no disco de estreia, sendo a oitava no set do álbum. Também no mesmo ano lançou a demo “Rest In Pain”. Ou seja, foi uma estreia de respeito com tudo que tinha direito. Só restava saber se tudo isso daria certo. E acabou dando certo, mas para a mídia “especializada” não era tão bom por não trazer nenhuma novidade. E como o fã mais tradicional não gosta de novidades envolvendo o Metal, a coisa andou melhor no bueiro, ou seja, fez barulho no underground. E como o Death Metal não é uma vertente de elite, temos que analisar por nicho para não perder o prumo da análise.
Enquanto nos Estados Unidos os poderosos Death, Deicide, Obituary, Cannibal Corpse, Master e Possessed comandavam a bagaça, na Suécia tínhamos como dominantes o Dismember, Unleashed, Grave, e também o próprio Hypocrisy. Obviamente que nosso caríssimo leitor vai lembrar outras bandas do estilo de renome e importância igual as que eu mesmo citei e pode até mesmo citá-las para completar o percurso. Agora no caso do Hypocrisy, devido ao que Peter absorveu de sua experiência longe de casa, a sonoridade ficou entre o que as bandas dos países citados proporcionavam ao público. De acordo com a gravadora, desde o debut até o álbum “The Final Chapter”, o Hypocrisy se tornou a banda de Death Metal mais popular no underground. Pode ser somente propaganda, porém não estou aqui para apontar a bazooka para lado nenhum. No entanto, basta olhar ao redor e perceber a quantidade de adeptos do estilo que curtem o trabalho de Peter e cia. Sim, eu sei! Isso não justifica em questão de números de vendas e bolso mais cheio da galera, mas como o Heavy Metal não é um estilo tão popular quanto diversos outros, aplico uma forma mais reduzida para avaliar este pequeno montante. Entre os artistas de diversas bandas do Metal extremo mundial, o Hypocrisy sempre figura entre as várias conversas sobre o assunto regado a muita cerveja e vodka. Depende da região do planeta e do paladar das figuras. Além do próprio “Penetralia”, os dois álbuns seguintes costumam ser citados e reverenciados por diversos artistas dos gêneros e fãs do estilo. “Osculum Obscenum” (1993) e “The Fourth Dimension” (1994) fecham a trinca inicial dos suecos.
Tanto a demo quanto o split lançados no mesmo ano do álbum serviram de aperitivo que foi essencial para chamar a atenção dos mais interessados em sonoridades do tipo. Isso fez com que “Penetralia” se tornasse mais forte ainda, causando um barulho grande em países que já exploravam esse tipo de som. Alguns citam como um Death sueco americanizado ou algo parecido, mas o fato é que esse disco não só abriu caminho para si, como ajudou bandas vizinhas a aparecerem de fato para um público maior tanto dentro do próprio país como também no exterior. É claro que a mudança na sonoridade ao longo dos anos elevou ainda mais o seu público, mesmo que muitos fãs mais tradicionais tenham deixado a banda de lado. O fato é que Peter sabia o que estava fazendo à época de seus três primeiros lançamentos com o Hypocrisy.
Uma curiosidade remetida às canções do primeiro álbum, é que a faixa “God Is A Lie” que aparece no EP mudou para “God Is A…” no disco. Se por acaso aconteceu algum tipo de censura quanto ao nome desta “múzga” eu não posso dizer, mas que ficou mais legal nesse formato, ficou sim. Trouxe um ar de mistério, deixando a letra que é bem simples um pouquinho mais bacana por assim dizer. As outras faixas da demo também figuram em “Penetralia”, porém com uma roupagem muito melhor. Ou seja, o formato ideal para tal sonoridade. Nesse início de jornada, o que as bandas de Death Metal procuravam executar e recitar em seus dizeres era muito mais voltado aos filmes e séries trash da época, juntamente com os temas anti-religião e contrários ao cristianismo e ao protestantismo. Com o Hypocrisy não foi diferente e fazer letras mais elaboradas não era o ponto chave do estilo. Hoje ao relembrar grandes clássicos do esporte sonoro ainda denoto a magia contida em cada verso simples e podre propositalmente em favor do que era feito.
Aos que ainda não conhecem esta grande obra chamada “Penetralia”, procure por canções como “Impotent God”, “Nightmare”, “God Is A…”, “To Escape Is To Die” e também a faixa-título. Isso já te dirá com toda certeza sobre a importância e relevância desse grande clássico do Death Metal mundial. O Hypocrisy pode ter mudado bastante com o passar do tempo, mas para quem está rabiscando o pergaminho virtual neste exato momento para sua doce leitura continua com sua primeira trinca de ases intacta e valorosa.
“You wake up in the middle of the night,
Wallowing in sweat
I’m the worst of dreams you ever feared
I’m in your dreams, I’m in your soul
You never get away from here, and that’s my goal.”
Nota: 9,4
Integrantes:
- Masse Broberg (vocal)
- Peter Tägtgren (guitarra)
- Mikael Hedlund (baixo)
- Jonas Österberg (guitarra)
- Lars Szöke (bateria)
Faixas:
- Impotent God
- Suffering Souls
- Nightmare
- Jesus Fall
- God Is A…
- Left To Rot
- Burn By The Cross
- To Escape Is To Die
- Take The Throne
- Penetralia