Dizem por aí que o terceiro disco de estúdio é aquele que consolida o espaço de uma banda na cena. Se não for isso, podemos estar presenciando o início de uma derrocada ou período de estagnação. E seria muito ruim algo dessa natureza acontecer com um nome tão proeminente como o Hazzerd.
O grupo canadense é dono de uma discografia curta, porém altamente proveitosa. Seus dois primeiros registros de estúdio são obras anárquicas (musicalmente), daquelas tão descompromissadas e/ou imprudentes quanto poderiam ser. E veja bem, isto não é uma crítica, é ótimo escutar álbuns despojados, intensos, crus e com os dois pés fincados no old school, mas ainda perceber que os músicos são extremamente ousados e criativos. Acredite, estes canadenses não ligam a mínima para padrões, conceitos ou fórmulas. E isso é notável.

Voltando um pouco, “Misleading Evil” (2017) e “Delirium” (2020) apresentam uma banda pronta para ser colocada em uma das prateleiras de cima do Thrash Metal. É claro que isso só poderá ser discutido com mais afinco caso o novíssimo “The 3rd Dimension” realmente estabeleça o grupo como “uma das grandes revelações” da atualidade. Tenha em mente que é isso ou uma inconveniente queda de produção. Nesta análise, iremos verificar mais uma vez a assertividade da famigerada teoria do terceiro álbum. Faça suas apostas e…
…let’s go Thrash, motherfuckers!
Começamos nossas ponderações falando um pouco sobre Dylan Westendorp, o rapazote por trás do kit de bateria. A sessão rítmica do Hazzerd é algo que realmente chama atenção logo nas primeiras audições. David Sprague é muito bom baixista, mas Dylan é uma das principais forças por trás da musicalidade do grupo. E o mais impressionante é que ele ainda cuida dos vocais principais. Sim, temos aqui um baterista/vocalista e, surpreendentemente, o cara entrega performances muito competentes em ambos os ofícios.

O outro fator que impressiona são as linhas de guitarra. Toryin Schadlich é uma besta fera imparável trabalhando na criação de riffs e solos tão mirabolantes e intensos quanto a mente humana pode conceber. Neste disco, ele foi ajudado pelo novato Nick Schwartz, que substituiu o guitarrista Brendan Malycky, mas se limita a trabalhar nas partes rítmicas. Basicamente, Nick faz o trabalho sujo para conceder a liberdade necessária para Schadlich poder brilhar. E ele realmente brilha.

Em termos de musicalidade, temos uma banda que foca seus esforços no Thrash Metal old school da Bay Area. Apesar disso, nada neste álbum (e também nos outros dois anteriores do Hazzerd) é previsível. A todo momento você será surpreendido por composições que simplesmente subvertem dogmas pré-estabelecidos do gênero. No início da audição temos um tiro de bazuca atingindo nossos ouvidos. Ele atende pelo nome “Interdimension”, uma canção bem direta, porém com diversas quebras de ritmo e que se recusa a seguir qualquer tipo de construção padronizada. Do meio para o final temos uma parte completa totalmente instrumental que parece realmente estar abrindo portais para novas dimensões.
Moshpits interdimensionais
Já “Scars”, apesar de usar a mesma metodologia de mandar um “fuck off” pras padronizações, traz como novidade alguns vocais mais altos, principalmente, no refrão. E por falar em vocais, Dylan Westendorp lembra bastante a forma de cantar e também os timbres de Mark Osegueda, do Death Angel. “Unto Ashes”, segundo a própria banda, teve como referência “Battery”, do Metallica. Mas é claro que o Hazzerd não conseguiu ficar dentro das quatro linhas e, apesar de algumas semelhanças em certos momentos, a faixa vai além do trivial.
Em “Deathbringer”, uma espécie de marcha metálica serve como introdução para um ritmo cavalgado quase aos moldes do Iron Maiden. Nesta canção em específico, Dylan soa como David Sanches, dos norte americanos do Havok. Podemos dizer que esta é a música mais Heavy tradicional da audição e o quarteto não decepciona.
“TTT” é uma ponte instrumental com pouco mais de 1 minuto de duração, onde alguns solos neoclássicos são executados em cima de um dedilhado muito bonito. Mas a calmaria dura pouco e “Plagueis”, com nítida inspiração no Death Angel, chega com o refrão mais pegajoso do álbum.
A próxima é o single “ThArSh TiLl DeTh”, e sim, é este mesmo o nome. A “escrita errada” é apenas uma brincadeira facilmente entendida quando se assiste ao divertidíssimo videoclipe abaixo. Em meio a mensagens do tipo “posers must die” e um clima de bebedeira com os amigos, está música tem toda a pinta de se transformar em um hino obrigatório nos shows ao vivo. “Parasitic” me fez lembrar de algo do Megadeth, principalmente, no que diz respeito as linhas e riffs de guitarra. Nada muito explícito, mas as referências estão sendo jogadas na mesa para os mais atentos.
As surpresas não param
E já que falamos de linhas e riffs de guitarra, “A Fell Omen” surpreende até mesmo o ouvinte mais treinado neste tipo de audição. Quando você olha e vê uma música com mais de 9 minutos de duração num tracklist de um álbum de Thrash Metal, a última coisa que passa pela sua cabeça é uma canção instrumental. Mas aqui temos uma criação tão acertada, tão criativa e tão bem construída, que você só percebe que está diante de uma música completamente sem vocais quando já se passaram cerca de 5 minutos. E acredite, neste momento você já estará completamente fisgado pelo talento dos canadenses.
O disco ainda apresenta “Control” como faixa de encerramento, mas me pergunto se não teria sido mais sábio terminar de forma apoteótica com “A Fell Omen”. De qualquer forma, “Control” é outra belíssima composição e possui – adivinhem? – mais um andamento diferentão e que encaixa perfeitamente com a proposta de todo o disco.

Respondendo as indagações feitas no começo do texto, se o terceiro trabalho é aquele que estabelece ou consolida a posição de uma banda na cena, podem preparar lugares mais altos na prateleira para colocar o Hazzerd.
E mais, eu apostaria todas as minhas fichas que estes caras não vão parar por aqui e, em breve, presenciaremos o lançamento de outros discos tão avassaladores quanto este.
Em um ano onde teremos a chegada de inúmeros novos álbuns de bandas veteranas e renomadas, a nova geração do Thrash, através do Hazzerd, manda seu recado em alto e bom som: “viemos para bagunçar as suas listas de melhores do ano!”
Nota: 9,5
Integrantes:
- Dylan Westendorp (bateria e vocal)
- Toryin Schadlich (guitarra)
- David Sprague (baixo)
- Nick Schwartz (guitarra)
Faixas:
- Interdimension
- Scars
- Unto Ashes
- Deathbringer
- TTT
- Pagueis
- ThArSh TiLl DeTh
- Parasitic
- A Fell Omen
- Control