Alguns músicos tem a famigerada fama de serem pessoas egocêntricas, difíceis de lidar, de trabalhar e até mesmo de conviver. Este tipo de artista acaba passando a maior parte de sua carreira pulando de galho em galho e não se firmando em nenhum projeto duradouro. Dependendo da fama alcançada, muitos acabam formando suas próprias bandas solo e, invariavelmente, trocam integrantes quando assim entendem que é necessário.
Mas e quando esse tipo de músico é o líder, o fundador ou a força motriz por trás de sua banda?
Temos alguns exemplos clássicos de nomes influentes na cena Metal que possuem estas características. O Annihilator, por exemplo, é uma banda que nunca conseguiu estabelecer uma formação fixa e troca seus membros de acordo com o humor do guitarrista Jeff Waters. As mudanças foram tantas que, para muitos fãs, o Annihilator nem sequer pode ser chamado de banda, mas uma espécie de projeto particular de Waters.
Outro nome muito influente e que possui esta fama é Dave Mustaine (líder, fundador, compositor e o único membro original ainda remanescente na formação do Megadeth). Mas o quanto essa fama é real?
É um fato que Mustaine já demitiu diversos integrantes do quarteto norte americano. Mas será mesmo que o Megadeth não passa de um simples projeto capitaneado por uma espécie de ditador sem escrúpulos? Será mesmo que Dave demite e contrata músicos sem motivos plausíveis?
Vamos entender melhor essa história.
O Megadeth foi fundado em 1983, lançou seus dois primeiros discos em 1985 e 1986, respectivamente. “Killing Is My Business… and Business Is Good!” e “Peace Sells… But Who’s Buying?” foram trabalhos extremamente influentes para a cena Thrash Metal em ascenção nos Estados Unidos e ambos foram gravados pelo mesmo time.
Na época tínhamos Dave Mustaine comandando as guitarras e os vocais, David Ellefson no baixo, Chris Poland como segundo guitarrista e Gar Samuelson na bateria. Tudo ia bem até que Chris Poland e Gar Samuelson foram sumariamente demitidos. Segundo Dave Mustaine, a banda passava por problemas sérios relacionados ao abuso de substâncias, mas alguns limites jamais poderiam ser ultrapassados. Segundo relatos da época, o baterista Gar Sumuelson havia se tornado uma pessoa muito difícil de lidar quando estava intoxicado e Chuck Behler (baterista que o substituiu no disco seguinte) já viajava com a banda. Os outros membros tinham medo que Gar não conseguisse terminar a tour devido ao uso incontrolado de heroína e carregavam um reserva imediato caso algum incidente acontecesse. Já Chris Poland, segundo a lenda, não tinha grandes problemas pessoais com Dave, mas em determinado momento resolveu vender equipamentos da banda para comprar drogas. Mustaine não perdoou tal ato e os dois acabaram sendo convidados a se retirar.
Anos depois, o próprio Chris Poland comentou sua demissão. Vejam o que ele disse:
“Foi como tinha que ser. A coisa chegou a um ponto onde era questão de tempo para mim. Aquilo não estava mais funcionando para ninguém. Quem sabe o que teria acontecido se eu tivesse ficado na banda? Provavelmente foi melhor que eu não tivesse ficado mesmo. Provavelmente as drogas teriam matado algum de nós, ou talvez todos nós”
Como Chuck Behler já viajava com a banda, ele assumiu a vaga de Gar Samuelson. Para o lugar de Chris Poland, nomes como Jeff Loomis (na época integrante do Sanctuary) e Jay Reynolds foram cogitados, mas a vaga ficou mesmo com o guitarrista Jeff Young. Nesta época, Dave Mustaine estava afundado nos próprios vícios e acabou sendo ele o protagonista de diversas confusões durante a turnê do álbum “So Far, So Good… So What!”, de 1988. Ao final da tour ele resolveu se internar e, após alguns meses limpo, resolveu que aquela formação jamais levaria o Megadeth para o próximo patamar.
Chuck Behler era apenas um baterista ok e só integrou a banda pela incapacidade de Gar Samuelson em permanecer minimamente controlável durante as excursões. Ele não tinha o DNA do Megadeth e durante o pouco tempo em que fez parte do time, jamais se fez notar. Já Jeff Young realmente não teve tempo suficiente para mostrar seu talento. O próprio Dave Mustaine assumiu que sua demissão talvez não tenha sido justa e escreveu uma carta para o guitarrista pedindo desculpas. Jeff revelou parte do conteúdo desta carta em uma entrevista concedida em 2018.
Abaixo estão alguns trechos da mesma:
“Sei que nossa relação teve altos e baixos. Quero dizer que sinto muito e gostaria de fazer a coisa certa agora. Tenho algo sério para falar também, ok? Estamos sendo considerados para a indução ao Rock And Roll Hall Of Fame no próximo ano ou daqui dois anos e eu gostaria que você estivesse lá comigo quando conseguirmos
Entenderei se você não me perdoar e é outra coisa que quero conversar com você, mas Prefiro fazer pessoalmente […] Preciso me desculpar por divulgar nossos segredos após sua saída. Jeff, sei que você sabe que eu estava decepcionado e, honestamente, sei que foi um alívio de certo modo para você. Tive medo de não encontrarmos alguém talentoso como você. Sinto falta de nossos bons tempos. Também me senti intimidado por suas habilidades incríveis na guitarra.
Nunca quis te afetar ou prejudicar a sua carreira […] Eu me curei do Metallica com muita terapia. Quando eles foram para o Hall Of Fame e não me deixaram fazer parte, todos sabem que Lars estava por trás daquilo. Prometi para mim mesmo que, depois daquilo, que faria as pazes com meus caras, para estarmos juntos nesse dia glorioso.”
O fato é que “So Far, So Good… So What!”, o registro gravado com Behler e Young, apesar de conter faixas fortíssimas como “In My Darkest Hour”, “Set The World Afire” e “Anarchy In The UK” (cover do Sex Pistols), acabou desagradando Mustaine, principalmente, com relação ao trabalho do produtor Paul Lani, que foi trocado no meio das gravações por Michael Wagener.
Para o próximo full-lenght, com um Mustaine que se dizia “limpo” e “um novo homem”, Ellefson foi mantido e para completar a equipe, o guitarrista Marty Friedman e o baterista Nick Menza foram contratados. Na época, Dave entendia que precisava de músicos extremamente técnicos que pudessem rivalizar com o talento da formação original. Este foi o time mais duradouro do Megadeth. Os álbuns mais importantes da discografia nasceram nesta fase. “Rust In Peace”, “Countdown To Extinction”, “Youthanasia” e “Cryptic Writings” elevaram o nome do grupo ao mainstream e apresentaram grande parte dos maiores sucessos do Megadeth ao mundo.
Aparentemente, tudo ia bem, mas internamente havia alguns problemas. Segundo alguns relatos da época, Nick Menza era o cara que enfrentava Dave Mustaine nos bastidores. E Dave não gostava disso. Mas nos anos 90 o Megadeth era uma banda de fato e todos opinavam, todos tinham voz ativa. Mustaine respeitava isso e convivia com alguns enfrentamentos aqui e ali vindos do baterista. Foi quando na turnê do álbum “Cryptic Writings”, Menza começou a ter alguns problemas relacionados ao abuso de álcool e drogas na estrada e isso começou a afetar suas performances ao vivo. Só que o buraco era mais embaixo e a queda de rendimento era mais do que apenas excessos fora do palco. Menza tinha um tumor em um dos joelhos e isso estava acabando com suas performances.
O baixista David Ellefson comentou sobre a turnê em questão e relembrou a época da demissão de Menza:
“Em 1998, ele estava lutando para fazer os shows. Houve um momento definidor na cidade de Macer, Arizona, quando olhei para ele durante a execução de ‘In My Darkest Hour’ e parecia que ele não estava presente. Ele estava acabado, sabe? Pessoas têm estilos de vida, fazem o que fazem na estrada. Eu estava sóbrio naquela época e agora também. Não estou aqui para policiar os outros. Se você estiver bem no palco, é o que importa. Se não estiver, aí é um problema, e estávamos naquele ponto da turnê do ‘Cryptic Writings’, nos preparando para o Ozzfest, que era algo grande para nós. A transição precisava acontecer ou não conseguirímos.”
Nick Menza definitivamente não lidou bem com a demissão e, no livro “Megalife: Nick Menza – The Book”, escrito por J. Marshall Craig, há um trecho que reconta a demissão segundo a ótica do baterista. Confira o trecho:
“Nick Menza ainda estava grogue devido à anestesia, mas ficou feliz quando os médicos disseram que o tumor em seu joelho era benigno e que ele poderia voltar a trabalhar em breve como o grandioso baterista de uma das maiores bandas de Thrash Metal do mundo, o Megadeth.
“Eu fiquei tão aliviado”, ele diz, “Achei que todas as preocupações tinham ido embora”
Então quando o líder da banda Dave Mustaine ligou dois dias depois, Nick esperava boas notícias sobre retornar à turnê no Ozzfest 98. Ao invés disso, Mustaine disse “estamos deixando você”.
Nick pensou que fosse uma piada. “Aonde? Na Disney? Pare de zoar, Dave. Agora não é hora”. Mas Mustaine não estava brincando e explicou, “Eu não acho que você está me ouvindo bem”.
Uma década e meia depois, Nick senta em sua cadeira no estúdio Menzanation em Los Angeles e reflete: “Foi isso”, disse encolhendo os ombros. “Minha carreira com uma das maiores bandas de Heavy Metal em seu auge acabou ali. Aquela notícia caiu em mim como uma bomba e foi ruim. Muito ruim”
“É, eu admito, eu cai em um buraco muito fundo e sombrio.”
Para o lugar de Nick Menza, foi chamado o baterista Jimmy DeGrasso (que entre outras bandas, tocou com o Suicidal Tendencies), mas o próximo disco marcou mais uma baixa importante, a do guitarrista Marty Friedman.
Com o sucesso alcançado pelos álbuns anteriores e os diversos hits radiofônicos incluindo “Symphony Of Destruction”, “A Tout Le Monde”, “Trust” e outras, Marty Friedman acreditava que a banda poderia se tornar muito maior do que apenas um grande nome do Metal. Era o auge do Metal alternativo e o exímio guitarrista queria que o Megadeth embarcasse naquela onda.
Segundo Dave Mustaine, em uma entrevista concedida ao programa de Eddie Trunk:
“A gravação de ‘Risk‘ teve grandes músicos. Você tinha Marty Friedman tocando guitarra. Era eu, pessoalmente, sucumbindo aos desejos de Marty de ser mais uma banda alternativa, e continuamos diminuindo a velocidade e diminuindo a velocidade e diminuindo a velocidade. Se esse registro fosse chamado The Dave Mustaine Project e não de Megadeth, eu acho que teria sido bem sucedido. As pessoas queriam um disco do Megadeth. Eles não queriam ver Dave se curvando para manter Marty Friedman feliz, porque Marty queria que soássemos como a porra do Dishwalla.”
Marty Friedman foi questionado sobre esta declaração e apenas se esquivou dizendo:
“Quando você está fazendo isso, gravando álbuns, você está fazendo o melhor que pode. E praticamente se você olhar para a imprensa no lançamento de qualquer disco, o que as pessoas estão dizendo naquele momento, é isso. E então, dependendo dos resultados disso, as histórias das pessoas mudam, mas na época, você está fazendo o melhor que pode… Você realmente acredita naquilo, todo mundo acredita naquilo e então é isso. Eu definitivamente nem começaria a pensar em quaisquer detalhes que estivessem acontecendo naquela época, é apenas a coisa mais distante da minha mente, mas posso garantir que tudo foi feito com a melhor das intenções e com o trabalho mais duro. E todo mundo estava apenas tentando fazer o seu melhor.”
Enfim, após as críticas negativas, principalmente, dos fãs mais antigos da banda, Dave Mustaine decidiu que o próximo disco de estúdio traria a sonoridade mais tradicional do Megadeth de volta. A ideia era uma espécie de volta às raízes e Marty Friedman não queria mais tocar aquele tipo de som. O músico saiu da banda por conta de “diferenças musicais”, esta foi a alegação oficial na época e ao que tudo indica, é mais do que verídica. Mas ainda houve um episódio revelado por Mustaine que aconteceu nas gravações de “Risk” e que, definitivamente, azedou a relação entre os dois.
Segundo Mustaine:
“Sempre acreditei que deveríamos dar ao guitarrista a oportunidade de fazer um solo que ele achasse certo para a música. Se alguém interpreta algo que não funciona, posso dar algumas sugestões. Se ainda não estiver acontecendo, posso dizer: ‘ok, é isso que eu quero que você toque aqui’.
Se um solo não funcionar totalmente, eu mesmo o farei. Foi o que aconteceu em ‘Breadline’. E Marty Friedman desistiu de mexer no solo em ‘Breadline’. A gerência da banda não gostou do solo. Eu disse a eles: ‘bem, vocês tem três opções. Ou vocês silenciam o solo completamente, pedem para Marty o refazer, ou eu faço isso’. E então, eu disse: ‘se eu fizer o solo, é melhor vocês falarem para ele’. Bem, eu refiz e ninguém contou a Marty. Foi isso.”
Para a vaga de Friedman, foi chamado Al Pitrelli, guitarrista da banda norte americana Savatage e o trem parecia ter entrado nos trilhos novamente. “The World Needs A Hero”, de 2001, apesar de não trazer o mesmo brilhantismo dos discos mais bem sucedidos de volta, trazia o peso. Os fãs aprovaram.
Nesta época, foi gravado o primeiro álbum ao vivo do Megadeth, “Rude Awakening”. O disco saiu em CD e DVD e as imagens comprovam que o quarteto estava nitidamente muito entrosado.
Mas aí o destino resolveu aprontar das suas…
Dave sofreu uma grave lesão no braço esquerdo em meados de 2002 e, segundo o laudo médico, ele dificilmente poderia tocar guitarra novamente. Segundo a nota publicada na época, o músico explicou:
“O diagnóstico foi de neuropatia radial e um nervo do antebraço estava sendo pressionado. Os médicos me informaram que será necessário, no mínimo, um ano para a recuperação mais completa possível e, mesmo assim, não saberiam quão completa ela seria. Estou sendo assistido por uma ótima equipe médica e de fisioterapeutas, se for a vontade de Deus, espero voltar a tocar guitarra um dia. Nesse meio tempo, enquanto tratava de recobrar o uso de meu braço, aproveitei a oportunidade para avaliar minha carreira e meu futuro. Decidi deixar o Megadeth e explorar outras áreas da música onde eu possa dar minha contribuição sem ter que tocar meu instrumento.”
É claro que o Megadeth não existiria sem a presença de Dave Mustaine. A banda encerrou as atividades oficialmente em 2002, mas os outros integrantes pensavam diferente. David Ellefson, Al Pitrelli e Jimmy DeGrasso queriam continuar mesmo sem Mustaine na banda. Resolveram emitir um anúncio procurando um vocalista/guitarrista e, além disso, Ellefson chegou a entrar na justiça para conseguir usar o nome Megadeth. Quando viu que isto não seria possível já que todos os direitos sobre a marca eram de Dave, o baixista processou seu ex-colega alegando que ele estava lhe devendo dinheiro oriundo de royalties e venda de merchandising. Ellefson pediu a singela quantia de 18 milhões e meio de dólares.
Obviamente, isto deixou Mustaine extremamente revoltado e o resultado foi o rompimento entre os outrora inseparáveis parceiros musicais. Ellefson perdeu o processo e ainda desembolsou uma boa quantia referente aos encargos. O baixista tentou se expicar anos depois e disse o seguinte:
“Eu acredito firmemente que Dave e eu acabamos nessa situação porque nós não estávamos nos comunicando diretamente. Havia um novo gerente, um novo advogado, uma nova equipe de pessoas trabalhando para o Megadeth e todos estavam tentando impressionar seu cliente, então, essas pessoas agiam mais ou menos assim: ‘bem, estamos apenas fazendo tudo o que o chefe nos diz para fazer’.”
Já Dave Mustaine, ácido como sempre, na época do ocorrido apenas desacreditou a tentativa de seus ex-companheiros:
“Esses idiotas pensaram que seria apenas colocar um anúncio no jornal dizendo ‘superbanda precisa de guitarrista’ e tudo estaria resolvido, mas se esqueceram que não há uma porra de um compositor entre eles. Isso é patético.”
Após dois anos de fisioterapia intensa, Dave Mustaine contrariou todas as expectativas médicas e voltou a tocar guitarra. Aliás, ele voltou melhor do que nunca. É verdade que não pretendia colocar o Megadeth novamente na ativa, mas sim lançar um disco solo, sendo assim, “The System Has Failed”, de 2004, não foi concebido para ser um novo trabalho do Megadeth. Por este motivo, Dave contratou músicos de estúdio para gravá-lo. O guitarrista original Chris Polland, após anos sóbrio, foi convidado para tocar no disco e aceitou desde que não tivesse que fazer uma turnê. Para o baixo, Jimmy Sloas foi chamado e, para a bateria, nada menos que o renomado Vinnie Colaiuta ficou responsável.
Acontece que a identidade musical de Dave Mustaine sempre caracterizou os registros do Megadeth e, quando finalizadas as gravações, todos que ouviam o material diziam: “isto é Megadeth puro!”. Dave foi convencido pela gravadora a lançar o álbum sob o nome Megadeth, mas para isso, precisaria retomar as turnês e não poderia contar com a formação que gravou o disco. Foram recrutados então o baixista James McDonough, o guitarrista Glen Drover e o antigo baterista clássico da banda, Nick Menza, mas cinco dias antes do início da tour, Menza foi dispensado novamente por conta de problemas relacionados a sua lesão no joelho. Shawn Drover, irmão do guitarrista recém contratado, assumiu as baquetas.
Durante a turnê, James McDonough, aparentemente, se sentiu incomodado com os rumores de que o baixista David Ellefson estaria retornando ao grupo e decidiu abandonar o barco. A saída do baixista ocorreu após uma declaração de Mustaine ao qual explicava a retomada de sua amizade com Ellefson.
Ele disse o seguinte:
“Na verdade, me encontrei para um jantar cara-a-cara com Ellefson pouco antes do Natal, apenas para baixar a poeira e deixar-lhe bem claro que não tenho nenhum rancor e que gostaria de manter a amizade com ele. Desde então, falamos inúmeras vezes ao telefone”
James McDonough postou o seguinte comunicado:
“Gostaria de agradecer a todos que me receberam bem e agradecê-los pelas ótimas memórias que tenho da estrada. Não tocarei mais com o Megadeth. Tenho certeza que Dave postará algo a respeito em breve. Obrigado novamente meus irmãos e irmãs do Metal”.
Mas ao contrário do que se especulava, Ellefson não retornou ao seu posto e James Lomenzo assumiu o baixo. Com ele, foi gravado o excelente “United Abominations”, em 2007. Já para o próximo disco, Glen Drover foi quem deixou a banda alegando problemas pessoais não relacionados a banda. Quando questionado, Dave Mustaine disse:
“Você sabe, em respeito a Glen, nao gostaria de comentar muito sobre isto. Ele tinha alguns problemas para resolver e estamos falando de alguém que saiu por questoes pessoais. Se ele não quis comentar nada, então porque eu deveria? Sinceramente não vejo outro motivo que não seja estar com a sua família. Glen é o irmão do nosso atual baterista (Shawn Drover) e seria muita estupidez minha falar sobre um ex-membro quando se tem o irmão do cara em sua banda, por isto não tenho nada a dizer. E mesmo que eu estivesse puto com Glen, que não é o caso, eu não iria comentar nada. Glen é um guitarrista talentoso e deu uma força para Chris Broderick (o novo guitarrista), ele foi o primeiro a recomendar Chris. Então fiquei realmente animado com isso”.
Após a porradaria à moda antiga proporcionada no álbum “Endgame”, de 2009, finalmente, chegava a hora de David Ellefson retornar ao seu posto. James Lomenzo foi dispensado de forma amigável e entendeu que estava cedendo lugar ao baixista original da banda.
Mas as mudanças de line-up voltariam a acontecer. Após o lançamento do bem sucedido “Th1rt3en”, de 2011, e do criticado “Super Collider”, de 2013, o quarteto novamente sofreria baixas, sim, no plural. Após a turnê de divulgação de “Super Collider”, em 2014, o guitarrista Chris Broderick e o baterista Shawn Drover resolveram sair quase que simultaneamente do Megadeth e formar uma nova banda, o Act Of Defiance.
Apesar de tudo ter soado orquestrado na época, Chris Broderick fez questão de explicar o que aconteceu de verdade:
“Bem, não vai ser tão empolgante quanto alguns esperam. Não vai haver nenhum drama enorme, nem nada disso. Simplesmente chegou a hora de eu sair da banda. Eu fiquei por sete anos e queria liberdade para criar e escrever qualquer coisa que eu quisesse, sabe, fazer tudo do meu jeito.
Eu vejo isso da mesma forma que vejo um chef que trabalha em um restaurante e decide montar o seu, ou um advogado que decide abrir o próprio escritório. Era a hora de seguir adiante. E eu acho que, quando falei com o Shawn, ele sentia o mesmo. Nós falamos sobre isso por um tempo. Então quando o Shawn saiu eu pensei, ‘nossa, o que aconteceu?’. Sei que havíamos conversado sobre isso, mas ele decidiu sair mesmo…
Nós nos falamos o tempo todo, então eu sabia que ele havia pensado nisso, eu também havia pensado. O Megadeth está vindo engrenado para o novo álbum e se você estiver com dúvidas sobre fazer parte disso, é melhor não se comprometer com todo o processo de criação e depois abandonar a banda. Então, quando o Shawn saiu, tudo ficou claro para mim. Eu falei com David Ellefson e depois falei com a Jackson Guitars, meus patrocinadores, todos me apoiaram. Todos diziam, ‘cara, a gente está contigo. Faz o que tem que fazer’. Então decidi naquela noite que seria o momento exato. Já que a banda está em processo de gravação de um novo álbum.
Dave Mustaine ficou chateado, obviamente… Isso não é algo que você queira ouvir. Talvez a única coisa que você precise saber é isso, nós somos músicos contratados, então…”
Em uma entrevista concedida em 2018, Mustaine contou uma versão um pouco diferente:
“Tínhamos uma formação estável e sairíamos em turnê com o Iron Maiden. Então, Bruce Dickinson teve câncer na língua. Tivemos que deixar pra lá uma turnê de um ano para fazer a tour com o Maiden e eles disseram: ‘oh, desculpe, a turnê acabou’. É claro que eu fiquei puto, porque deixamos a estrada por um ano e então o guitarrista e o baterista foram informados pela empresa de gerenciamento na época: ‘vocês precisam arrumar outro trabalho neste ano’. Então eles não quiseram esperar e saíram. Você ficaria surpreso se eu lhe dissesse que fiquei bravo com isso? (risos) Sim, eu fiquei, e minha família teve que lidar com isso, o que foi meio chato.”
Sobre o primeiro e o último ponto levantado por Broderick, sobre ter liberdade para escrever qualquer coisa que quisesse e sobre ser apenas um músico contratado, talvez uma recente declaração de David Ellefson elucide um pouco mais como as coisas estavam funcionando nesta época.
Na declaração abaixo, Ellefson se refere as gravações de “Super Collider”:
“No primeiro dia em que tocamos… Demorou alguns dias por que estávamos ouvindo todas as coisas. E a gerência queria ouvir as coisas de todos. E Dave reconheceu que todos tinham algumas coisas que ele gostava. E então entramos em uma sala, com as guitarras e instrumentos, selamos a sala e começamos a tocar e trabalhar em alguma coisa. E veja bem, eu não estava neste ambiente há 10 anos. Por que isso foi em 2011 e a última vez que trabalhamos em um disco juntos foi em ‘The World Needs A Hero’, em 2001, então, foi literalmente dez anos antes. Eu estava trabalhando com pessoas de todo o tipo nesse período, foi algo como, ‘ei, que ideia matadora. Que tal isso agora? E que tal isso?’. Você sabe, algo colaborativo. Eu estava tendo conversas musicais na sala. Sabendo como as coisas eram no passado, Dave começava com algo, trazia uma ideia e talvez alguém diga: ‘ei, isso é legal. Que tal adicionarmos esse pedacinho aqui? Ou talvez esse riff combine com esse riff.’ E então eu disse: ‘ei eu tenho algo que pode combinar com isso’. Dave imediatamente largou a guitarra e entrou no escritório. Eu olhei para Shawn Drover, E Shawn e Chris estavam apenas balançando a cabeça. Eu disse: ‘o que diabos foi isso?’. E ele disse: ‘cara, confie em mim. Os dias de colaboração já se foram. Aquele Megadeth que você estava acabou!’. Então falei com Dave no escritório e ele estava furioso, mas ainda assim não queríamos que nossa nova amizade se deteriorasse, então eu disse, ‘qual é o problema?’. E ele disse: ‘não tente colocar suas idéias nas minhas músicas.’ Eu disse: ‘sem problemas, tudo bem. Hoje é o primeiro dia, sem problemas’. E essa foi a última vez que tocamos juntos no sentido de tentar compor algo. Tudo depois disso, em todos os outros discos do Megadeth depois disso, era apenas Dave escrevendo as músicas.”
Polêmicas à parte, sabemos que as bandas possuem fases e, sabendo de tudo isso que foi relatado, fica evidente que estamos falando de uma época conturbada para o Megadeth. Tanto que isso refletiu diretamente na musicalidade dos discos. Enquanto “Th1rt3en” ainda pode ser considerado um bom disco, ele não é tão épico quanto os dois antecessores. Já “Super Collider” foi uma verdadeira decepção e desagradou quase todos os fãs.
Algo realmente impactante precisava ser feito e foi nessa época que Dave Mustaine e David Ellefson tentaram se reunir novamente com Marty Friedman e Nick Menza para reviver a formação mais clássica e, para muitos, a mais talentosa de toda a carreira da banda.
Nick Menza chegou a ensaiar com Mustaine e Ellefson e ajudou a compor algum material para o então vindouro álbum, “Dystopia”. Mas os problemas de saúde perseguiram Menza até o final e, mesmo que ele não assumisse isso publicamente, a grande realidade é que Menza não fez parte de nenhuma banda relevante depois de sair do Megadeth e nunca mais enfrentou uma sequência grande de shows. Logo nos primeiros ensaios ficou evidente que ele não conseguiria dar conta do recado e como as negociações com Marty Friedman envolviam muitos zeros nos contracheques, a solução encontrada por Mustaine foi novamente reformular o line-up.
O guitarrista brasileiro Kiko Loureiro foi indicado por David Ellefson enquanto o baterista Chris Adler foi uma solução momentânea de estúdio. Kiko chegou e agradou Mustaine em todos os aspectos, mas Adler não permaneceria. Na verdade, ele apenas gravaria o álbum, mas como Dave gostou muito de sua técnica, acabou sendo persuadido a fazer parte da turnê de divulgação, pelo menos até o Megadeth encontrar um baterista definitivo. O sueco Dirk Verbeuren acabou sendo uma indicação de Chris Adler.
Tudo parecia bem, o Megadeth tinha sido muito bem sucedido com “Dystopia”, finalmente venceu o Grammy e trabalhava em seu novo disco de inéditas. Todos os envolvidos rasgavam elogios ao material, mas aí aconteceu o escândalo sexual envolvendo o baixista David Ellefson e ele acabou sendo demitido.
Ellefson é casado há mais de duas décadas e tem dois filhos, mas isso não o impediu de ser flagrado em chamadas íntimas com uma fã. Quando os vídeos foram vazados, a notícia que correu dava conta que a fã era menor de idade, o que o colocava em uma situação bastante complicada perante a lei e perante a opinião pública. Mais tarde, esta informação foi desmentida, mas o Megadeth não quis ter a sua imagem sendo vinculada a tal escândalo.
Segundo Ellefson:
“Na noite em que os vídeos vazaram, algumas pessoas disseram, ‘ei, não diga nada’. Em particular, os caras do Megadeth não queriam que eu dissesse nada. Mas a equipe jurídica disse, ‘Ei, eu acho que você deveria dizer algo. Eu acho que algumas pessoas fizeram coisas bem cagadas aqui e estão fazendo acusações falsas sobre você, e você tem todo o direito de se defender’. E eu resolvi me defender. Como resultado, isso levou à minha demissão do Megadeth. Mas eu tenho todo o direito, assim como qualquer um, de me defender, especialmente quando alguém faz acusações falsas sobre você dessa forma. Então, eu lidei com isso naquela noite, e bem honestamente, foi isso… estava encerrado, realmente encerrado. Mas depois, o Megadeth entrou no assunto e tomou uma atitude, e não que eles não deveriam, mas eles tomaram. Isso rapidamente levou eles a me dispensarem e a seguir em frente longe da banda.”
Mustaine disse o seguinte:
“Com tudo o que aconteceu nos últimos 10, 20 anos no meu relacionamento com nosso antigo baixista, chegou a hora de seguir em frente… é tão desconfortável para mim falar sobre isso. Foi difícil para mim deixá-lo ir. Mas estou mais feliz agora do que nunca.”
Obviamente, aconteceu uma enorme troca de farpas entre os dois nos meses seguintes e se você quiser saber tudo o que foi falado, basta dar uma pesquisada nas nossas notícias do ano de 2022. Mas como este não é o foco por aqui, vamos voltar ao que interessa. Steve DiGiorgio regravou as linhas de baixo do novo álbum e, James Lomenzo, o mesmo baixista que deixou a banda para o retorno de Ellefson, retornou ao posto agora para substituir o baixista original.
“The Sick, The Dying And The Death” foi lançado em 2022 e tem arrancado elogios tanto da mídia especializada quanto dos fãs. Percebe-se claramente que a banda está mais unida e tudo tem fluído melhor. Inclusive, as composições do novo álbum são divididas e não estão mais concentradas todas em Dave Mustaine, o brasileiro Kiko Loureiro e o baterista Dirk Verbeuren contribuíram muito com a musicalidade do trabalho.