Os irmãos Seregor (ex-Inger Indolia, ex-Vaultage) e Ardek (Clemens Wijers, ex-Dark Mutation, ex-Vaultage) formam o núcleo principal da horda neerlandesa que buscou inspirações no clássico “O Senhor dos Anéis”, de J.R.R. Tolkien, para batizar essa que vem sendo um dos grandes destaques do Black Metal atual. Carach Angren significa “mandíbulas de ferro” em Sindarin. Sobre o baterista Namtar (Consonance, ex-Anxiety, ex-Vaultage, ex-From Earth (live), ex-Septicflesh (live)), ele acabou se desligando da banda recentemente, mas seu nome figura nesta nova jóia forjada pelos deuses do submundo e que fora lançada no dia 26 de junho via Season Of Mist. Também foi disponibilizado um lyric video da faixa “Monster”, buscando apimentar um pouco mais a sede de seus adeptos em adquirir o novo material.
Sabendo que o Carach Angren se definiu como um trio, a banda realizou um show recentemente na capital de São Paulo, e que pela qual fez parte do cast do evento “Extreme Hate Festival”, na qual eu mesmo aqui estive presente. E como ainda não os conhecia, estava mais atento ao headliner Unleashed, que além de uma das minhas bandas favoritas no Death Metal , seria a primeira passagem deles em terras “brazukinhas”. Acabei não assimilando muito bem esse show dos pertencentes à Landgraaf, Limburg. Porém, não é apenas um show mal interpretado que poderá me trazer uma resposta definitiva. Não seria justo apenas definir a situação assim, e tenho certeza que a banda não era aquilo que me passou somente. Até por que muitos que estavam presentes gostaram do que viram. Pois bem, o décimo oitavo portão do inferno foi aberto novamente e estamos diante de mais um rito de lava pútrida prestes a exalar sua magia negra ouvidos afora. Vamos experimentar juntos este feitiço, e ver se o poderio é realmente grandioso por aqui. Antes lembro ao caríssimo leitor que a horda laranja possui neste momento a bagatela de seis full lengths lançados, além do EP “Ethereal Veiled Existence” (2005), e da demo “The Chase Vault Tragedy” (2004).
A abertura da escrita musical corrompida é iniciada por “Here In German Woodland”, que já denota o mal agindo perante um resquício de paz com a intenção de putrefar tudo ao seu redor aqui na floresta alemã. A sonoridade sinistra é narrada e apresenta esse momento calmo prestes a se perder por completo. Na sequência sombria temos “Scourged Ghoul Undead” remoendo a arcada óssea dos seres vivos e não-vivos com sons de teclado que ampliam o ar de trilha sem se perder e sem buscar se parecer com um filme. Antes de tudo virar de ponta cabeça no melhor sentido da coisa, há uma narração antes de acontecer a desgraça sonora: “Pequeno caixão branco abaixado no chão / Pais gritando, desesperados – profundamente / O relógio bateu doze horas e a família voltou para casa / Mal sabiam que horrores estavam por vir.” Fechando a trinca inicial aparece “Franckensteina Strataemontanus”, em que o próprio nome já entrega sobre o que se trata. A sonoridade alterna entre o cinematográfico e o Black Metal mais cru colocando-nos em cena diante de uma criação abominável. “Galvanismo e alquimia, ciência para alguns, bruxaria para outros / Vinho virá da água e ouro da pedra / Preparando poções de carne e osso de animais / O perfume da morte é minha colônia mais doce” – quem não gostaria de ser Deus por um dia?
“The Necromancer” chega dando continuidade ao ritual sombrio e contornado por cortinas vermelhas e faixas pretas das telas de cinema. Os riffs lembram um pouco os trabalhos de Zakk Wylde ao lado de Ozzy Osbourne, mas sem perder a sua essência macabra e seus ideais movidos a pedais duplos voluptuosos e teclados incandescentes. “Eu posso ouvir o uivo dos lobos, o assobio das cobras / Ao invocar deuses proibidos, sombras se distorcem em formas demoníacas.” A quinta ponta de lança carrega consigo o nome de “Sewn For Solitude” e pode tranquilamente ser considerada a música mais voltada ao Black Metal norueguês por ser mais direta, mesmo que guiada por vocais limpos dos quais se encaixam muito bem neste trecho do percurso. “O que é que você fez? / Que estragos você causou? / Mestre! / Veja a criatura que eu me tornei / Monstro para muitos, amigo para ninguém” – a cria desejando vingança contra o seu criador.
“Operation Compass” vem na sequência para digamos, “amenizar” os ânimos dos seres inframundo. Não carrega a emoção e o cheiro de enxofre como a faixa anterior, mas mantém a carruagem em chamas no traçado correto. Talvez por conta de uma efusiva interpretação teatral exercendo o poder de compasso da operação, isso tenha deixado a canção sem o ímpeto devido. “Tanques sombrios estremecem, ossos descorados desmoronam / Forragens frescas para canhão, brutalmente abatidas / Crostas endurecidas de carne e sangue enfeitam as margens.” Agora como havia citado no início do percurso, “Monster” é a canção que recebeu um lyric video e traz consigo uma introdução bastante peculiar e repleta de mistérios até que os instrumentos “normais” se reencontram em destaque. A canção começa narrada de uma forma alinhada ao seu nome. Leviathan é colocado como uma criatura maligna o suficiente para ir até as últimas consequências sem pudor algum. Enquanto a canção segue a sua estrada, gritos de sofrimento e dor entoam e contornam a sonoridade. “Eu não vou exatamente assustá-lo debaixo da cama / Vou torturá-lo, estuprá-lo e dissecá-lo e não vou parar nem mesmo na morte” – um monstro que não representa apenas uma alcunha boba.
O oitavo anel pertence a “Der Vampir Von Nürnberg”. Não cheguei a mencionar, porém em algumas músicas anteriores podemos conferir versos na língua germânica que enfeitam de forma positiva a magia negra giratória que conhecemos por LP. “Fixado, fascinado pelas experiências de Democritús / Lentamente, seu espírito cresceu de coração preto e malévolo / Fina era a linha que separava a ala psiquiátrica da casa / Mas o cemitério é onde ele gostava de andar” – esse era o vampiro de Nuremberg (Nürnberg para os mais íntimos) apoiado por uma sonoridade bastante versátil e afiada de Seregor, Ardek, e Namtar. Os trechos finais da “múzga” ficam ainda mais intensos que o convencional da mesma, até que antes do fim nos deparamos com um grunhido da criatura não-viva. “Skull With A Forked Tongue” apresenta um clima fantasmagórico e um ritmo que lembra as bandas Mystic Circle da Alemanha e Theatre Des Vampires. A caminhada por entre pântanos venenosos revela os segredos da feitiçaria, envolvendo um crânio amaldiçoado através de uma conjuração arcana. “Consultando o crânio noite após noite desde a lua nascente até a manhã ficar clara / Diga-me como erguer o véu que separa a vida da morte para que eu possa roubar o Santo Graal.”
Próximo do fim do exorcismo em notas e acordes tem “Like A Conscious Parasite I Roam” que segue alternando entre o som mais extremo e as passagens climáticas. Em alguns momentos a guitarra “some” um pouco devido ao excesso dos efeitos climáticos voltados para os teclados que não considero inimigos. Porém, em alguns momentos poderiam equilibrar um pouco mais isso. “Como um parasita consciente, eu perambulo / Perdido, confinado pelas margens da vida / Aqui na floresta alemã / Eu espero o sangue inocente chegar” – um ghoul que acreditou que a vida eterna poderia lhe ser melhor, o que de fato não foi o que aconteceu. E que anseia por redenção. Fechando o livro das cruzes invertidas aparece no rodapé da obra “Frederick’s Experiments” mantém todo o clima das faixas anteriores e muitos artifícios sonoros para tirar do Black Metal convencional, sendo que em determinados momentos funciona muito bem e em outros nem tanto. O próprio nome já indica sobre o que realmente é abordado neste final de história, onde são contados os prazeres devidos aos experimentos bizarros de Frederick II que envolvem morte e vida de seres. “Frederico II, Sacro Imperador Romano-Germânico / Um homem com gosto pelo horror científico / A busca pela linguagem primordial da humanidade / Um experimento desenvolvido por uma mente sádica e sombria.”
Os elementos inseridos em sua sonoridade colocam o exuberante “carai na grelha” no caminho do Sympho Black e do Post-Black Metal, transitando pelo old school e pelo formato mais moderno. Para facilitar minha própria descrição, digo com clareza duas grandes influências sonoras, sendo o Dimmu Borgir (principalmente o atual) e Cradle Filth (esse das fases mais góticas). E embora possua tais referências, obteve a meu ver uma boa evolução em sua proposta com esse novo artefato. Somado às influências das obras de Tolkien e filmes trash de terror antigos, resta saber se essa evolução será contínua ou não. Espero que sim! E que possam retornar para fazer uma nova apresentação por aqui em breve.
“Die Leiche ist noch Frisch ich trinke ihr Blut
Oh Gottverdammt das tut richtig gut.”
Nota: 8,4
Integrantes:
- Dennis “Seregor” Droomers (guitarra, vocal)
- Clemens “Ardek” Wijers (teclado, piano, orquestração, vocal de apoio)
- Ivo “Namtar” Wijers (bateria, percussão)
Faixas:
1. Here In German Woodland
2. Scourged Ghoul Undead
3. Franckensteina Strataemontanus
4. The Necromancer
5. Sewn For Solitude
6. Operation Compass
7. Monster
8. Der Vampir Von Nürnberg
9. Skull With A Forked Tongue
10. Like A Conscious Parasite I Roam
11. Frederick’s Experiments
Redigido por Stephan Giuliano