Sente-se ao meu lado colega, olhe no horizonte e admire a paisagem avermelhada pelo sangue de tantos homens, admire o céu enegrecido pela pólvora de todos os canhões disparados, e veja a exuberante nuvem atômica se formando na sua frente. O cogumelo mortal anuncia a nova era do poder bélico e destruição em massa, após os ataques genocidas em Nagasaki e Hiroshima, o ‘mundo se viu em alerta’ a um possível ‘massacre’ que o próximo ‘império humano’ poderia criar. Talvez algum dia na ‘batalha final’, ‘Damien’ se erga em ‘rebelião junto aos mortos’ e destrua todos os ‘falsos comandos’, que se dizem os donos da terra. Seja a inconsequência humana, ou a falta de amor, talvez a busca cega por ideais furados e auto aceitação, a decadência da sociedade é vista a passos largos de uma destruição total. E é isso que o Metal busca criticar, não o lado a ou o lado b da equação, mas sim ela por um todo, afinal não existem apenas dois caminhos na nossa estrada da vida. Analisar como um todo os problemas gerais e mostrar a mesquinhes e a falta de escrúpulos da raça mais odiosa de toda cadeia alimentar, sempre foi o que o Thrash Metal fez e é uma das coisas que chama atenção junto a seu som sujo e rápido. Seja por meio de letras que exaltam crimes bárbaros, que simplesmente falam da brutalidade de seu som, uso de drogas ou ‘idealizando’ banhos de sangue, esse estilo rápido contaminou a cena com o seu surgimento, e desde 1980, o mundo fervilha de bandas que executam esse estilo com maestria.
Lá trás, com os lançamentos dos primeiros plays do Metallica, Slayer, Kreator e Sodom, o mundo viu como o Heavy Metal podia ser rápido, sujo e mesmo assim, contagiante. As letras que não tinham censuras e eram diretas impactavam e chocavam os mais sensíveis. Então estava criado ali uma das veias do que seria futuramente conhecido como Death Metal, algo muitas vezes grotesco, rápido, sujo e brutal. Nesse meio tempo, diria que de 1983 até 1987, o Brasil apresentou um cenário fértil e promissor para o Metal em geral. Durante esse período, surgiram bandas tais como Korzus, Vulcano, Sepultura, Dorsal Atlântica, Attomica, Anthares, Overdose e claro, os cariocas do Taurus. Considero o lançamento de “Signo de Taurus” de 1986 como o real e primeiro disco de Thrash Metal, legitimamente, brasileiro, além do som rápido e sujo como deve ser, o disco é totalmente cantado em sua língua pátria, o que dá um gostinho de quero mais a essa excelente produção. Criada pelos irmãos Sérgio e Claudio Bezz (bateria e guitarra) a banda carioca surgiu em 1985 e lançou 2 de demos que mais tarde seriam a composição completa do primeiro lançamento do quarteto. O petardo de 1986 inicia com a ótima introdução instrumental “Signo de Taurus”, com suas cordas suaves que progressivamente se tornam riffs pesados e encharcados de Overdrive, uma bateria simples e profunda estremece tudo com ajuda do peso do baixo carregado de Jean, os coros ao final da faixa servem para criar uma imersão ainda maior no ouvinte e prepara-lo para a subsequente “Mundo em Alerta”. Os riffs rápidos cortam o ambiente e nos surpreendem, se combinando com uma cozinha extrema, criando o ambiente perfeito para a voz agressiva e aguda de Otávio. As letras de fácil compreensão desembocam em um refrão repleto de significado e contagiante, bradar as frases “Líder nazista, líder infernal / A força de sua mente o mal” se torna algo fácil e lhe coloco em meio a campos de guerra sangrentos, te fazendo se sentir parte de um exército de resistência ao regime diabólico nazista. A qualidade excelente desse lançamento segue para a faixa “Massacre”, uma aula de riffs rápidos e sujos, um trabalho de composição excelente dos dois irmãos. A letra, escrita por Otávio, é uma ode ao metal e só mais um adorno para essa faixa bruta e completa.
“Império Humano” possui uma construção mais trabalhada e não tão rápida, mas com riffs excelentes, um baixo bem técnico de Jean e linhas vocais assustadoras, a faixa se torna um grito de desespero em meio ao tamanho da desgraça causada pelo ser humano, as letras diretas e conscientes mostram ao Brasil como o Metal surgiu em forma de crítica e não como apoiador de x ou y, “Isto sim é um império humano / Só vence aquele que tem o poder / Fome, pobreza, isso não importa / Seu interesse, o poder e a glória / Poder, sangue e glória / Eis o lema humano / Poder, vingança e ambição / Eis a causa de tudo”. O bem contra o mal é o tema do próximo som executado pelos cariocas, “Batalha Final” presenteia o ouvinte com um tema clássico e bem conhecido, mas em sua forma perfeita de apresentação, as rapidezes dos instrumentos combinados com o vocal agudo de Otávio não deixam a menor dúvida de o quanto o Brasil não tem nada a perder para os artistas estrangeiros. Dessa vez a profecia é sobre “Damien” e o som apresentado segue de perto a profecia sombria, as bases em power chords e os vocais obscuros e as vezes rasgados chegam a causar pequenos calafrios em meio a profecia do príncipe das trevas. “Rebelião dos Mortos” vem como complemento a profecia anterior de Damien, a possibilidade dos mortos voltarem e se rebelarem com a demência dos vivos deixa de ser um medo para se tornar uma esperança em meio aos riffs cadenciados da faixa, que ecoam pelos ouvidos dos desavisados. O solo rápido e cheio de personalidade faz sua presença e mostra que Thrash não é só riffs brutais e sim músicas complexas e bem-feitas. Para o final do petardo, ouvimos “Falsos Comandos”, uma composição que une bons elementos já apresentados pela banda e com 6 minutos de duração, os cariocas conquistam os ouvidos mais atentos a cada nuance e quebra de tempo. Novamente a letra direta e crítica a sociedade dominante encanta com sua realidade perante os nossos dias: “Seres humanos, com a violência / Criaram o seu próprio, mundo cruel / Suas criações, como bombas e armas / Destroem aqueles, que fogem as regras”.
Relembrar esses clássicos atemporais nos faz cada vez mais amar o Metal e reverenciar o lirismo e a qualidade de composição desses monstros nacionais.
Nota: 9,0
Integrantes:
- Sérgio Bezz (bateria)
- Cláudio Bezz (guitarra)
- Otávio Augusto (vocais)
- Jean (baixo)
Faixas:
- Signo de Taurus (intro)
- Mundo em Alerta
- Massacre
- Império Humano
- Batalha Final
- Damien
- Rebelião dos Mortos
- Falsos Comandos
Redigido por Yurian ‘Dollynho’ Paiva