Por meio da litografia virtual, trago gravuras retiradas das grandes histórias envolvendo a cultuada “família Satan”, representação essa que fez certo barulho durante a nostálgica década de 80 e retornou os trabalhos nos últimos anos, permanecendo em atividade até então. Aos amantes do Heavy Metal desta saudosa época, ressalto que o Satan é uma das principais pontas da rosa-dos-ventos do famoso movimento da NWOBHM, e que só não conseguiu obter maior relevância por conta do seu próprio nome, o que a impedia realizar altas projeções. Em 1983, onde o movimento já demonstrava perda de fôlego graças ao surgimento e lapidação de novos subgêneros, a banda lançou seu trabalho mais relevante até então, falo de “Court In The Act”, álbum aclamado no meio underground por quem de fato vivenciou essa época. A concorrência era muito grande e dificilmente quem começava pelas beiradas acabava se tornando parte do centro das maiores atenções, mesmo que o disco fosse um primor de trabalho. Por ser o álbum de estreia dos ingleses, a agressividade e o empenho contidos na obra trouxeram bons frutos iniciais aos caras, porém, em pouco tempo começaram a sentir bastante dificuldade em conquistar seu devido espaço. Graças ao fato do álbum ser bem mais direto até por conta do nome, que o tornava muito impactante para o mercado, optaram por mudar a nomenclatura do time, e junto a isso, o lendário e mítico vocalista Brian Ross saiu para cuidar melhor de seu Blitzkrieg que era outra banda seminal do movimento. Ele deu lugar a Lou Taylor, que chegou a fazer alguns shows em 1982 com o próprio Satan antes mesmo de Ross integrar à banda e entrar em seu posto.
Ainda sobre a mudança de nome, o que realmente tornou essa ideia definitiva foi para evitar serem associados a bandas de Metal mais extremas como o Venom. Outro fato interessante que se dá através do surgimento do Blind Fury é que esta foi formada em Londres por membros do Angel Witch, incluindo Kevin Heybourne, e o já citado vocalista Lou Taylor. Esta formação gravou sua primeira demo antes de se dissolver. Neste ponto aconteceu o retorno de Lou Taylor, voltando ao Satan e substituindo Brian Ross. Toda essa história se iniciou em 1979, na cidade de Newcastle, pelos guitarristas Russ Tippins e Steve Ramsey. A trajetória se deu com a junção de forças com o baterista Andy Reed e o baixista Graeme English. Para completar o ‘line up’ foi chamado o vocalista Trevor Robinson. Isso foi o início através do Satan. Outros integrantes participaram da saga dessa valiosa família até que surgiu o momento da mudança que fora comentada acima. A formação estabelecida e considerada clássica tanto para a banda quanto para os fãs é a seguinte: Steve Ramsey e Russ Tippins nas guitarras, Graeme English no baixo, e Sean Taylor na bateria. Para a formação de “Out Of Reach”, a única mudança (Lou Taylor nos vocais) que aconteceu influenciou nitidamente na sonoridade do disco, tornando-o mais melódico e menos pesado, de acordo com a voz de Lou. E isso trouxe dúvidas para os respectivos fãs. Muitos nem sequer faziam ideia de que se tratava da mesma banda por ter mudado de nome, além da sonoridade que apresentava elementos distintos com relação aos trabalhos anteriores, tanto o debut “Court In The Act”, quanto às demos e apresentações ao vivo.
Agora sob a alcunha Blind Fury, era notória a intenção de entrar de vez no mercado para competir com mais força diante de outras várias bandas que estavam buscando a sua fatia também. Obviamente que boa parte das bandas abdicava do conhecimento econômico e de marketing, sempre prezando pelo lado mais simples que era apenas de fazer o seu som (e ganhar dinheiro). E ganhar dinheiro de qual forma se essas bandas tornavam isso como algo proibido para as ditas bandas “verdadeiras”? Isso também atrapalhou um bocado não só o Blind Fury, mas também outras bandas de potencial grande igual aos londrinos. Não que o Blind Fury pensasse diretamente assim, mas como boa parte dos próprios fãs pensavam e continuam a pensar e dizer isso até os dias de hoje, não dava para assumir assim de cara para não se queimar no certame musical. Por conta de tantas mudanças, até mesmo da própria capa que era bem diferente da primeira era do Satan, o Blind Fury sofreu bastante com isso e acabou entrando para o seleto grupo de bandas ‘cult’, na qual consiste em tornar bandas e discos muitas vezes excelentes e com pouco ou nenhum reconhecimento tão relevantes quanto os discos de maior sucesso.
Muitos poderão pensar que o nanquim anda falhando e que o Blind Fury / Satan está sendo ‘nerfado’ por aqui, mas a ideia do quadro é entender e estender o assunto sobre os motivos do álbum escolhido ter sofrido algum tipo de injustiça e se o mesmo teria poder de fogo para obter melhores resultados, caso seguisse por outras rotas. Só que o Blind Fury e nem o Satan eram o Iron Maiden, e cabe ao dono da pena de cisne real buscar o máximo de informações e ideias para não elevar ou piorar um trabalho mais do que o mesmo é de fato. “Out Of Reach” é um daqueles vários álbuns com um conteúdo bastante rico, mas que não figurou entre os melhores álbuns do ano respectivo ao seu lançamento. Lançado no dia 7 de maio de 1985 via Roadrunner Records, a bolacha inglesa prometia mais do que outrora, mas em um cenário tão disputado, teria que exercer um amplo trabalho de marketing para que este mesmo chegasse a lugares mais distantes com relação ao centro do movimento da época. Todas as canções de “Out Of Reach” são creditadas à banda, enquanto as letras ficaram a cargo do próprio Lou Taylor. O artefato giratório foi gravado e mixado no Touch Sound Studios, Middlesex, Greater London, Inglaterra, outubro de 1984.
Você agora deve estar se perguntando: “E a viagem? Não vamos mergulhar nas ondas sonoras desse disco? Já comprei a passagem!” Sim, era isso o que eu ia mencionar neste exato instante, pois já me aprontei também e é hora de embarcar neste álbum do Satan com nome substituto e temporário. Pois é, logo depois retornaram com o nome de antes e desde então seguiram com o nome Satan, tornando o álbum “Out Of Reach” como o único full length com o logo do Blind Fury. Em 1986 já com o nome Satan de volta, lançaram o EP “Into The Future”, e no ano seguinte lançaram o álbum “Suspended Sentence”, que tiveram outras formações e são ótimos trabalhos, mas que causaram pouco impacto muito pelo histórico de mudanças e incertezas da própria banda quanto ao caminho traçado. Agora podemos abrir as cortinas e ver se o público está dormindo ou se está empolgado em relembrar ou conhecer este glorioso trabalho do Satan. Ops! Quis dizer Blind Fury!
Com certeza você já deve ter ouvindo em algum momento de sua trajetória, como pequeno headbanger, o seguinte trecho: “DO IT FAST, DO IT LOUD, DO IT NOW!” – parte do refrão da faixa de abertura intitulada “Do It Loud”, que começa a jornada com os primeiros compassos de bateria de Sean Taylor, em seguida vem o baixo de Graeme English, até que toda a turma se encontra e o Heavy Metal começa a pulsar dos alto-falantes. Você deve mostrar através dos riffs rápidos da dupla Tippins e Ramsey que nada ainda está perdido e que você pode seguir em frente, mas sem querer mudar os hábitos dos outros. Faça por si só e se sairá muito bem junto a toda a magia proporcionada pelas guitarras melódicas e ainda sim, cortantes! Isso sem falar nos solos que premiam a abertura do álbum e o início da trama que se mostra muito marcante. Provavelmente você já tenha ouvido de alguém mais antigo ou que já conheça a obra que essa é uma das faixas mais grudentas do álbum. Olhando pelo retrovisor avistamos a faixa-título, ou seja, “Out Of Reach” entra em cena logo nos primeiros cruzamentos entre as ruas de acesso e a avenida principal. Os primeiros segundos trazem o ar da graça de uma balada. O lance das melodias é verdadeiro e torna esse álbum uma parte diferente do que fora projetado na carreira do Satan, carregando o papel de Blind Fury. Mas, não pense que para por aí. O Metal tradicional toma conta das alças que levam à autoestrada adiante. O baixo de Graeme English é quem causa todo esse efeito e serve de emenda para os solos de guitarra e as bases insanas tanto de Tippins quanto de Ramsey, enquanto você perde a concentração e entende o quanto caminho para não perecer em vão. Você é forte e percebe as mentiras de um falso sábio, mas que logo se posiciona em busca de se livrar dos males que afetam a sua mente para que se sobressaia e não se deixe levar por ideias sem propósito ou valor. Outra faixa que provavelmente não sai da sua mente.3
Fechando a primeira trinca metálica temos “Evil Eyes”, canção esta que apresenta seu arsenal de forma marcante com Lou Taylor bastante empolgado, entoando um grito antes das primeiras notas de guitarra, até que tudo se alinha em um só propósito, o de tocar Metal. “Oh! Você malditamente tudo que você vê, mas você não pode me ver de jeito nenhum… / Porque sou sábio aos seus olhos!” – projeções futuras relacionadas ao desconhecido e à observação dos acontecimentos feita tão em terra firme quanto em outro plano astral. É uma canção mais leve que suas irmãs anteriores, mas que não destoa do formato do disco, contando sempre com a técnica apurada do baixista Graeme, e de toda a cúpula das cordas. A mágica do primeiro contato com o Rock é exibida em “Contact Rock and Roll’’. Esta é uma “múzga” que caberia facilmente em uma trilha sonora de filmes com viagens pela estrada em busca da próxima parada para fazer um barulho dos bons. Outra faixa bem marcante que figura entre as principais de todo o disco com seu refrão bastante grudento e seus solos extravagantes e bem construídos. “Contact! Rock and Roll… (x3).”A próxima canção é dedicada aos dublês de filmes de ação, e “Living On The Edge” coloca ainda mais sentido em suas letras através de sua sonoridade que começa de maneira peculiar com todo o ar da boa época, e que logo descamba para o Metal tradicional até os ossos que conhecemos. “Quando Hollywood liga, eu sou pago pelas minhas quedas / Na vida que levo / Estrelas em seus carros enquanto eu carrego as cicatrizes, / Eu choro e sangro” – riffs e levadas que tornam o trabalho de substituir as estrelas internacionais em suas cenas mais perigosas numa coisa muito mais séria e importante. Isso sem contar as passagens de bateria, baixo e o vocal de Lou que mantém uma boa afinação com relação ao que é despejado em matéria de som. “LIGHTS, CAMERA, ACTION!!!… JUMP!”
“Há um lugar que conhecemos,
Onde há um show de Rock and Roll,
É o único lugar que conhecemos… “
Esse verso acima abre à dedicatória ao Mental Metal Headbangers no Dynamo Club, Eindhoven, Holanda. Com uma levada bem Rock and Roll, a aposta se encaixa de maneira excepcional no álbum. A energia apresentada se torna bastante evidente durante o percurso sonoro em que a sexta composição nomeada “Dynamo (There Is A Place…)” dá as caras por aqui para mostrar ao público que mesmo de nome trocado a banda continua gravando material qualificado. Para quem perdeu o orgulho e não pode mais caminhar sozinho, o Blind Fury oferece ao ouvinte mais uma canção bem trabalhada e executada de forma magistral. Todos os instrumentos mantêm a projeção positiva quanto ao disco e isso só facilita para que todos possam experimentar esse hábito. Estou falando da faixa “Back Inside” que possui a sequência de solos mais belos de toda a obra. Cortesia de Ramsey e Tippins. A canção termina destacando o poderio dos vocais de Lou Taylor. A fúria cega termina com “Dance Of The Crimson Lady, Part 1”, em que parte de um sonho pode ser real e parte dele pode não ser. A lady pode dançar pelos céus, te chamar e te indicar o caminho para poder segui-la, mas ela pode não estar lá. E sob uma aura mais misteriosa, a última canção dá seus primeiros passos sonoros e investigativos para resolver tal questão. O distorcido baixo de Graeme English, apoiado pelas guitarras de Steve e Russ, coloca em evidência toda essa procura e dúvida entre o real e o sonho. Com os vocais melodiosos e potentes de Lou Taylor e a bateria precisa de Sean Taylor, toda a estrutura é formada e coloca em prática durante a caminhada. O fim da estrada está próximo e nós nos deparamos com um final digno ao que remete a década de 80.
Percebemos que certos detalhes como mudança de nome, de integrantes, de estilo, de capa, de logotipo, e até mesmo as estratégias comerciais podem influenciar no sucesso ou fracasso de um determinado disco. Felizmente o Blind Fury está ativo e com seu primeiro nome de batismo, ou seja… SATAN!!!
Para o desfecho final vale citar outros componentes da “família Satan”, como o Pariah e o Skyclad, ambas as bandas pertencentes à árvore genealógica do Satan. Porém, aqui é Blind Fury, e se você não conhece ou faz tempo que não escuta este álbum, aproveite este grande momento do esporte sonoro!
“Nunca tente mudar meu estilo de vida,
Você vai descobrir que sou mais forte do que antes,
Se você acredita que pode fugir da contenda,
Você é só um bebezinho, você não aguenta mais… !!!!”
Nota: 9,0
Integrantes:
- Lou Taylor (vocal)
- Steve Ramsey (guitarra)
- Russ Tippins (guitarra)
- Graeme English (baixo)
- Sean Taylor (bateria)
Faixas:
- Do It Loud
- Out Of Reach
- Evil Eyes
- Contact Rock And Roll
- Living On The Edge
- Dynamo (There Is A Place…)
- Back Inside
- Dance Of The Crimson Lady, Part 1