Lançado no exato dia 1º de janeiro de 2025, “Vltra Mortem et Infera” é o debut da banda italiana de Black Metal, Mors.
De fato, o país da bota já apresentou ao mundo grandes diamantes detalhadamente lapidados e dos mais variados estilos. Tudo isso em se tratando de Metal. Obviamente que, a Itália possui bastante tradição em outros âmbitos musicais. Contudo, não adentraremos nesse multiverso da loucura musical e seguiremos com a nossa receita primordial: o Heavy Metal. Assim sendo mais específico, o Black Metal.
O Mors é oriundo de Como. Como é uma comuna italiana da região da Lombardia, capital da província de Como. A cidade é um importante centro industrial ao lado de Milão, conhecida principalmente pela sua antiga manufatura de seda. E como tudo deve ser bem organizado e explicado nos mínimos detalhes, vamos aos fatos contidos neste artefato sonoro. Ademais, é importante saber qual foi o seleto grupo que organizou essa tramoia, no melhor dos sentidos.
O mapeamento inicial do Mors
Conforme foi dito acima, o Mors é uma banda estreante no quesito lançar full lengths. Ou seja, a banda está debutando em 2025, dois anos após o hasteio de sua bandeira. A banda é formada pelo multi-instrumentista Bazzy Mogan (ex-Inferi, ex-HomSelvareg), pelo vocalista Yr-nhhngr (Bolvangar, Spells of Misery, Werelight, ex-Gavrhoth, Dying Knight’s Lament) e pelo vocalista de apoio Giovanni Vecchiè, na qual utiliza o pseudônimo Vèrfarkas (Cold Raven, Tanun, ex-HomSelvareg). Portanto, um power trio da maldade.
Informações oficiais adicionais:
- Todas as músicas foram compostas por Bazzy;
- As guitarras, baixo e bateria foram gravados por Bazzy;
- As vozes principais e letras foram feitas por Yr-nhhngr;
- As segundas vozes foram gravadas por Vèrfarkas;
- As gravações e produção foram realizadas por Bazzy nos estúdios de gravação de Isola S. em Arosio, Como;
- Reamping, mixagem e masterização por Gabriele Gramaglia no Crepuscolar Sound Studio, Milão.
- Capa desenhada por Bazzy e Vèrfarkas;
- O design do columbário é um trabalho artesanal de Manuel Scapinello;
- Curadoria da obra por Francesco Gemelli.
Mors: além da morte e do inferno
Além da morte e do inferno é como iniciamos a jornada sem saber em primeira mão o que se esperar por ocasião. A sonoridade se abre como um leque em meio ao anoitecer, como se o próprio ouvinte pudesse tocar o primeiro acorde de guitarra. O som é claro em meio ao obscuro e serve como fator condutor para a elevação do mesmo. Tal elevação se mostra simplória no começo do percurso, mostrando o afiar das armas musicais durante a trama.
Porém, o tempo fecha e a tempestade se inicia de forma abissal. O Black Metal profano está diante de nós. Vocais rasgados e apoiados pela segunda voz são o charme por entre os versos vociferados. A bateria muda a sua direção, mas sempre a favor dos vento. Entretanto, a sujeira recebe um colar de solos brilhantes de guitarra. Contudo, a danação se mantém intacta e ganha mais força. No final há um recital simulando uma catedral maligna, até que tudo volta a ser insano e devastador novamente dentro da premissa da faixa homônima.
Mors e a queda do templo
Ao continuar a caminhada em solo petrificado e coberto por uma ossada sem fim, temos a destruição do templo sagrado através das marretadas incessantes de bateria. Mas a violência musical não pende para o retilíneo e simples, pois há uma linha de guitarra qualificada a ser explorada com maestria. Fica evidente durante os solos melódicos e mudanças de andamento. Quanto à ala extrema, esta se mostra presente e atenta ás nuances do céu nada estrelado. Vocais em forma de recital em púlpito soam de forma cavalar e arrogante de tão alucinante.
Mais próximo do final da perturbação submundana do Mors, acontecem cantorias em forma de lamentos e o ritmo ganha tons quase voltados para o Doom Metal, mas que não chega a ficar arrastado a ponto de ter tal assinatura. Assim sendo, temos a apresentação de “La distruzione del tempio”.
Céu em chamas
Contudo, pouca desgraça sonora é besteira. Adentramos ao terceiro nível de catástrofes após o primeiros lamentos. Um dedilhado limpo e misterioso surge para abrir caminho para o berro esticado característico do estilo e orientado pelas chamas divinas contra o mundo carnal. Porém, você se depara com uma sonoridade cadenciada e que mistura a sujeira com a melodia. Entretanto, isso acaba permitindo passagens mais insanas e mais breves.
Os vocais racham os céus, provocando chamas infernais no alto do mais profundo e longínquo que você consegue enxergar. Os solos reforçam as camadas mais agudas e adubam o solo percussivo para que siga violento e perspicaz. Assim como o ataque nefasto de Deus. Destaque também para o contrabaixo e sua receita proveitosa para o mal de “La stella ardente di Delo”.
De volta à insanidade musical, a bateria é quem intima a todos para um ataque visceral e desencadeado por um estela cadente guiada pelo que antes era tido como divino. Entretanto, os riffs são mergulhados nos mares do Heavy tradicional e contemplados pelo lado negro da força. Podemos colocar como um Black/Heavy, já que ambas as passagens possuem destaques próximos, com o Black Metal prevalecendo. Principalmente entre baixo e bateria. Os solos seguem a conduta da trama, enquanto os vocais passam por variações interessantes.
Mongólia, Nepal, são países com pessoas que fazem aquele tipo de gutural que lembra uma corda de aço vibrante. Seu término é uma súplica bastante incisiva para que “Meteora” não atinja o solo.
Escuridão absoluta
Além das portas da escuridão também existe a escuridão plena. Adentramos a esse salão vazio e lotado ao mesmo tempo. Ao fundo ouvimos um dedilhado melancólico e cativante. Isso chama a atenção das alas mais monstruosas e robustas da sonoridade contida nesse pergaminho maléfico. Portanto, logo entendemos que se trata de um ensaio para o caminho mais devastador dessa faixa.
O Black Metal mais extremo, sem perder as melodias, aparece para enterrar o machado das trevas e partir os espíritos e as carnes pútridas ao meio. Os músicos intercalam momentos mais contidos e melodiosos com trecho mais intensos e até mais longos que as partes menos densas. Contudo, isso dá um ganho para a canção que se sobressai perante sua premissa de soar agressiva e cativante ao mesmo instante. Os solos, já na parte final, são o charme de “Oltre le porte del buio”.
O Sol reacende em meio a um céu bem mais escuro. Isso ocorre, certamente, devido ao passeio lúgubre inicial. A passagem sonora carrega em sua flâmula um desejo com o intuito de trazer a angústia e a revolta musical. Novamente, temos o Mors mais insano e também melodioso nos momentos propícios. Embora a ideia já não seja surpresa, as partes mais rápidas e a condução de pratos da bateria bem presente, formam o âmago sombrio da mesma. Entretanto, o melhor momento fica por conta do trecho em que flerta com Speed/Black. Por fim, ainda cabem gotas grandes de melancolia e solidão da metade para o fim de “Il sole nel più oscuro dei cieli”.
O crepúsculo púrpuro
As ruínas causadas pelo homem fazem deste mundo um amálgama de fotografias lindas, unidas a uma desgraça descomunal e contínua. O fim dos tempos é marcado pela receita sombria e infame dos italianos e a massa sonora carrega o tempero necessário para apimentar o anoitecer e amedrontar o alvorecer. Acredita que esse momento é perceptível um banho rápido no lado do Thrash?
Poderia ser aquela linha de Black/Thrash em que o Black e o Thrash possuem partes específicas, sem que se torne o subgênero híbrido em sua essência. Os vocais trazem a ideia contida, principalmente, nos almanaques gregos do Rotting Christ. Durante os solos é facilmente notado o tilintar dos pratos bem voltados para o estilo citado. Todavia, isso ocorre em meio aos ótimos solos de guitarra e a levada em base contida de notas estendidas. O final é aquele apontamento extremo e muito bem executado em prol da “Le rovine dell’uomo”.
A grande apoteose ocorre junto a um crepúsculo púrpuro. Black Metal daqueles para você entrar na valsa depois de boas doses de uma bela stout para combinar com o clima. “Un crepuscolo purpureo” possui momentos de pura rifferama e o fato de utilizarem o dialeto natal, traz um corpo com muita identidade musical a favor da banda.
Observações profanas finais de um clima soturno e assombroso
Com toda a certeza, posso afirmar que o Black Metal evoluiu de tal maneira que poucos discos podem ser deixados para trás. Até mesmo aqueles trabalhos mais crus, simplórios e rústicos, soam muito bem quando se possui um conjunto decente de ideias.
Quanto ao Mors, a sua estreia acaba por se tornar algo com bastante presença e projeção futura. Primeiramente, por apresentar recursos dos mais variados dentro de sua sonoridade e sem perder a sua principal premissa. Junto ao debutante “Vltra Mortem et Infera”, temos linhas musicas que trazem à tona bandas do calibre de Besatt, Varathron, Graveworm e Necrophobic. Além de Marduk e o já citado Rotting Christ.
Contudo, os apontamentos positivos para tais bandas pode variar de ouvinte para ouvinte. Afinal, estamos falando sobre uma obra inquieta e que não se contenta em ficar presa em um único lugar. E para finalizar, temos mais uma banda italiana chutando a porta para buscar o seu espaço no setor extremo do Metal. E eles começaram muito bem para isso! Basta investir em mais variações que coloque os momentos mais intensos ainda mais em evidência.
nota: 8,7
Integrantes:
- Bazzy (guitarra, baixo, bateria)
- Yr-nhhngr (vocal)
- Vèrfarkas (vocal de apoio)
Faixas:
- Vltra Mortem et Infera
- La distruzione del tempio
- La stella ardente di Delo
- Meteora
- Oltre le porte del buio
- Il sole nel più oscuro dei cieli
- Le rovine dell’uomo
- Un crepuscolo purpureo
Redigido por Stephan Giuliano